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Arquitetura paramétrica eleva possibilidades arquitetônicas a níveis exponenciais
Ferramentas digitais paramétricas-algorítmicas-generativas já contribuíram para a criação do maior espaço fechado e maior estrutura de aço do mundo, além de prédios mais inteligentes, resilientes e sustentáveis.
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Paula Maria Prado em 18 de abril de 2024 7minutos de leitura
Foto: Reprodução/Safdie Architects
Curvas acentuadas e formas geometricamente complexas. Assim é a arquitetura paramétrica, que une tecnologia computacional (algoritmos) à arquitetura e à construção civil. Esse tipo de modelagem tem ganhado espaço entre profissionais da área no Brasil, uma vez que permite a criação de edifícios de alto desempenho a uma velocidade projetual que impressiona.
Ainda que do ponto de vista da computação tudo seja paramétrico – e a linguagem de programação faça parte do processo de modelagem desde o surgimento da computação gráfica, no início da década de 1960 – a expressão “arquitetura paramétrica” ou “design paramétrico” ganhou popularidade a partir da segunda década do século 21, quando aplicativos de modelagem passaram a utilizar linguagens de programação de maneira gráfica.
“Os scripts de programação que são, em geral, textuais, passaram a ser usados como porções de códigos encapsulados em elementos gráficos. Então, foi possível pegar um elemento gráfico, colocá-lo na tela e conectá-lo a outros elementos. A partir disso, tornou-se possível controlar a forma, produzir outras mais complexas e mexer nela de maneira instantânea”, explica André Luís de Araújo, arquiteto e professor de design e computação na Faculdade de Arquitetura, Design e Planejamento, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
Ou seja, é como se, ao modelar uma edificação, as paredes estivessem vinculadas às lajes e aos tetos. À medida em que se altera o pé direito da laje, as paredes acompanham o novo projeto de maneira automática. Assim, tais softwares auxiliam o arquiteto em seu processo criativo e o ajudam a tomar melhores decisões a partir da análise de parâmetros, como carga estrutural, rota dos ventos, clima, dimensionamento de tensões, carta solar e materiais utilizados, entre outros.
“Esses softwares facilitam a vida do arquiteto, principalmente diante da possibilidade dele explorar alternativas de projetos, tanto de design quanto de arquitetura, de maneira muito rápida, quase instantânea. Outra vantagem, é poder testar cenários juntamente com simulações computacionais de processos ambientais. Já há uma gama de programas no mercado que simulam efeitos ambientais, como insolação, iluminação e ventilação, para dar três exemplos”, opina Araújo, que coordena o Form-Based Information Lab na UFU, também conhecido como Informa 3D – laboratório que dá suporte aos projetos de arquitetura a partir de tecnologias de computação gráfica, matemática, lógica, inteligência artificial e modelagem paramétrica.
Receita de bolo
No processo parametrizado, a arquitetura ganha um leque de opções que podem ser exploradas de modo mais ágil, sem a necessidade de elaboração manual de cada modelo para determinada situação. É como se o profissional fornecesse os ingredientes e o computador colocasse na mesa todos os pratos possíveis.
Para Felipe Tavares, engenheiro de estruturas e professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), que atua em pesquisas sobre modelagem paramétrica, simulações numéricas e fabricação digital com aplicações em edifícios e cidades, uma vez que entendemos que um projeto é composto por parâmetros, torna-se humanamente impossível determinar sem a ajuda de uma ferramenta digital qual a configuração mais adequada para que um determinado sistema predial apresente o melhor desempenho.
“Se o meu objetivo é otimizar a luz natural do dia em um ambiente interno, poderia ter como parâmetros desse modelo as dimensões da janela, as dimensões deste ambiente, a orientação desta janela e o nível de proteção solar, dentre outros fatores”, diz o professor. “A combinação de configuração destes parâmetros pode chegar a dezenas ou centenas de milhares de possibilidades, o que torna humanamente impossível se determinar com apenas o recurso de representação gráfica. Mas é possível programar o computador para procurar a melhor resposta dentre essas possíveis combinações de parâmetros, obtendo uma solução melhor de projeto”, completa.
Fato é que, se “o papel aceita tudo”, o computador elevou essa máxima a níveis exponenciais, ainda que, segundo os especialistas, as restrições sejam as mesmas de outras épocas: todo profissional deve levar em conta as variáveis físicas do local e as condições de construtibilidade.
“Os limites podem se apresentar de diversas maneiras. O modelo não faz mágica. É um processo completamente lógico. Quando se modela um objeto parametricamente, está se modelando muitas vezes uma tipologia que contém suas diversas variações configuracionais. Também, precisa-se atentar para a compatibilidade da forma geométrica gerada com o material a ser empregado e com a máquina a ser usada para fabricar o objeto e/ou suas partes”, afirma Tavares.
Trocando em miúdos, é preciso ter um equilíbrio entre forma e métodos construtivos disponíveis. “Não pode haver uma exploração indiscriminada da forma. Isso iria onerar as construções e os processos de manutenção e operação desses edifícios”, crava André Araújo.
Arquitetura paramétrica na prática
Um dos exemplos mais icônicos de arquitetura paramétrica é o Heydar Aliyev Center, projetado em 2013 por Zaha Hadid. Sua sinuosidade, que impressiona a todos, foi gerada a partir da análise do local e suas necessidades. Entre os principais parâmetros utilizados estão a topografia acidentada do terreno e o desejo de integração e fluidez entre os espaços internos e externos.
Há ainda o Beijing National Stadium, na China, projetado pelo escritório suíço Herzog & de Meuron, consagrado como o maior espaço fechado e maior estrutura de aço do mundo, com 26 km de aço desembrulhado. E o Museu do Louvre Abu Dhabi, nos Emirados Árabes, feito pelo atelier Jean Nouvel, da França. O projeto focou em conciliar as questões climáticas extremas do local e o clima confortável internamente para o visitante. Além da plasticidade alcançada, a cobertura automatizada da construção se move de acordo com as variações climáticas.
Na aplicação da arquitetura paramétrica em interiores, destaque para o Walt Disney Concert Hall, em Los Angeles, projetado por Frank O. Gehry.
No Brasil, ainda são poucos os exemplos de formas complexas, tais como os exemplos internacionais. Já com formas mais tradicionais, temos o Centro de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, que possui uma cobertura em gridshell – estrutura tridimensional curva em grade ou treliça –com painéis quadrangulares e uma vedação em vidro.
“A forma desta cobertura já é uma tipologia que tem uma complexidade tal que dificulta ser projetada apenas com o paradigma da representação gráfica, isto é, apenas com base no desenho de plantas e cortes, mesmo usando o computador. Para este caso, o uso de um modelo paramétrico facilita, e muito, determinar diversos parâmetros de projeto, tanto para o desempenho da estrutura, quanto para o desempenho lumínico, térmico, acústico etc”, afirma Tavares.
Ainda de acordo com o professor, empresas brasileiras de madeira engenheirada usam ferramentas paramétricas em seus projetos, mas nem sempre são formas curvas ou complexas.
Destaque também para o CoBlogó, em Taboão da Serra, criado pelo escritório paulistano SUBdV, pioneiro no uso desse tipo de tecnologia aplicada à arquitetura. O edifício em si possui uma forma bastante regular, mas em sua fachada, composta por blocos, foi usada computação paramétrica, simulação ambiental e fabricação digital guiada pela metodologia High Low (High – tecnologia utilizada para a geração da arquitetura através da computação e Low – instruções produzidas para que uma mão de obra não especializada pudesse construir a fachada de blocos de concreto).
“A exploração dos blocos fez com que a fachada ganhasse uma força e identidade diferentes, ao mesmo tempo em que criou condições de iluminação no interior únicas e bastante eficientes. Ou seja, nem sempre a arquitetura paramétrica precisa estar ligada a formas complexas. É possível usar em determinados elementos”, disse Araújo.
Parametrismo X Arquitetura, Design ou Projeto Paramétrico?
Dentro da universidade, não há uma uniformidade na nomenclatura utilizada para definir esse tipo de arquitetura. Muitas vezes, “arquitetura paramétrica” ou “design paramétrico” pode ser utilizado para se referir a objetos arquitetônicos de formas curvas e de aspecto inovador ou incomum, projetado utilizando ferramentas digitais paramétricas-algorítmicas-generativas.
Contudo, é possível projetar edifícios usando formas tradicionais, ainda que com o uso dessas ferramentas digitais. “Quando se define o termo como ‘Arquitetura Paramétrica’, pode levar ao entendimento de que é o estilo visual de uma produção arquitetônica, em analogia a algum movimento como o Modernismo e o Ecletismo, entre outros, associando também a supostamente um movimento chamado Parametrismo, cunhado pelo arquiteto Patrik Schumacher do escritório Zaha Hadid Architects”, explica Tavares.
Para ele, “Projeto Paramétrico” é o termo mais apropriado para o processo de projeto que usa “o recurso paramétrico-generativo-algorítmico incorporado por uma ferramenta digital, para projetar formas curvas ou não, inovadoras ou tradicionais”.
E o futuro?
De qualquer forma, ao que tudo indica, o uso de softwares do tipo é um caminho sem volta. No entanto, o assunto neste ponto é polêmico. Para André Araújo, o trabalho manual do arquiteto deve ser mantido. “O processo do desenho é, mais que uma expressão gráfica, um processo de estudo e entendimento da espacialidade, até da materialidade. E, a partir dele, há uma aproximação do arquiteto à sua solução”, afirma.
“O processo computacional demanda do arquiteto um entendimento ou uma produção de instrução, na qual ele está focado. Ou seja, não é tão instantâneo quanto pegar um lápis e espacializar uma ideia. Existe uma perda de cognição ao utilizar o computador enquanto ferramenta criativa, principalmente nos estágios iniciais do design, quando a intencionalidade está sendo colocada para fora”, continua ele, que defende que o computador deve ser utilizado, sim, mas em uma etapa subsequente ao estresse da solução no papel, para que se entenda principalmente as variáveis ambientais.
Já para Tavares, o futuro da arquitetura mora no uso do tempo para pensar o projeto. O trabalho braçal pode ser feito pelo computador. “Assim, essas ferramentas podem estar completamente interligadas com o processo de projeto, de construção e de administração da infraestrutura predial”, opina.
Ele vai além: o edifício construído pode ter instrumentos com sensores que alimentam um modelo digital (gêmeo digital), que facilita a administração da infraestrutura por meio da análise de dados e inteligência artificial. “É a obtenção da forma (de elementos, edifícios e cidades) por meio da busca de uma configuração de parâmetros que geram um melhor desempenho. Estes, atrelados a questões de viabilidade financeira da construção e de menor impacto ambiental, seja pelo carbono incorporado nos materiais, pela energia incorporada ou até pelo consumo energético em sua operação”, conclui.
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