Chuvas nas cidades com mais frequência são desafios

Mudanças climáticas forçam planejadores a reavaliarem a forma como analisam dados históricos de chuvas nas cidades.

Por Redação em 4 de março de 2022 3 minutos de leitura

chuvas nas cidades

Apenas nos primeiros dois meses de 2022, a cena dos impactos das chuvas nas cidades se repetiu na Bahia, em São Paulo, em Minas Gerais, e, recentemente, no Rio de Janeiro, com enchentes, desabamentos e tragédias. 

De certa forma, esse é um dos impactos do pico de chuvas no verão brasileiro que vem se intensificado ano ano e deve seguir dessa forma, como consequência dos efeitos da mudança climática global. Segundo dados do Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU, as chuvas fortes no mundo já são 0,3 vezes mais frequentes e 6,7% mais intensas. Em um cenário de aumento da temperatura, as chuvas podem se tornar 30,2% mais volumosas e mais frequentes. O relatório indica que a média global de uma chuva muito forte por década pode chegar a triplicar, chegando a 2,7 por ano. Com isso, as cidades ficam em posições complicadas para posicionarem os seus planejamentos. Afinal, se o comportamento do clima está mudando, como contar com dados históricos para entender e prever o padrão das chuvas? A resposta de especialistas pelo mundo é: não é possível! 

Tempestades mais mortais que furacões

chuvas nas cidades

Nos Estados Unidos, o debate sobre usar históricos desatualizados de chuva para montar os próximos passos para proteger a população em caso de desastres naturais começou a agitar os órgãos públicos. Alguns números têm 50 anos de idade, ou seja, não refletem a mudança climática. Por isso, algumas agências públicas estão criando caminhos alternativos. É o caso de autoridades locais do Texas focadas em esforços para enchentes. Em 2016 elas se juntaram com os engenheiros do exército norte-americano para analisar os dados de precipitação do Estado. O resultado? Descobriram que as grandes tempestades que atingem a região na época dos furacões estavam se tornando mais violentas (passando de uma média de 330,2 milímetros de chuva para 431,8 milímetros de chuva), o que significa que, sem o planejamento devido, elas podem se tornar mais devastadoras que os próprios furacões. 

Com a nova informação em mãos, várias entidades em Houston tiveram que rever os planos de construção de áreas residenciais e de estradas. “Todo mundo, depois de ver como as profundidades das chuvas aumentaram, sabiam que isso afetaria como e onde os projetos se desenvolveram”, disse Craig Maske, o chefe de planejamento do condado de Harris, no Texas, à NPR. Os projetos de infraestrutura de mobilidade da região, por exemplo, começaram a prever como poderiam absorver uma quantidade maior de água.

Ainda nos Estados Unidos, a Universidade de Washington criou, em parceria com as cidades de Portland e Seattle, uma ferramenta online que tenta analisar e prever as mudanças das chuvas na região em um tempo maior de 25 anos. 

Brasil em foco

Em entrevista à Folha de São Paulo, o pesquisador da USP e pós-doutor em planejamento urbano e mudanças climáticas, Ivan Maglio, comentou que as chuvas mais fortes ampliam as áreas de risco dentro das cidades. “Áreas que historicamente não inundam podem passar a sofrer com as inundações. Precisamos mapeá-las”, disse. “Não basta tratar os riscos físicos quando há emergência, é preciso criar planos e adaptação climáticas para minimizar esses problemas com prevenção e preparação”, completou. 

“A gente precisa aprender a conviver com a incerteza da previsão; ou seja, trabalhar com previsões probabilísticas e tomar ações com base na probabilidade de ocorrência de um determinado evento”, afirmou  ao Jornal da USP, o professor do IAG-USP, Pedro Leite da Silva Dias. Dados da instituição mostram que o número de temporais com mais de 80 milímetros de chuva aumentou em recorrência no período de 2000 a 2018 em comparação com as décadas de 1940 e 1950. No caso de chuvas extremas, acima de 100 mm, o aumento foi de quatro vezes no mesmo período (8 contra 2). 

“É uma roleta russa”, afirmou o diretor do Instituto de Biociências (IB) e coordenador do programa USP Cidades Globais, Marcos Buckeridge, ao jornal da USP. “Precisamos ficar preparados para o pior.”