Corretor do futuro: algoritmos sozinhos não fecham negócios

Profissionais usam as tecnologias a seu favor e mantêm a empatia como um dos diferenciais competitivos para fechar as vendas

Por Redação em 20 de dezembro de 2021 6 minutos de leitura

O Brasil tem cerca de 460 mil corretores imobiliários credenciados em um dos Conselhos Regionais de Corretores de Imóveis (Creci). Os dados indicam que se trata do segundo maior contingente regulamentado desse tipo de profissional no mundo. Somente a National Association of Realtors (NRA), dos Estados Unidos, congrega um número maior de corretores, com 1,5 milhão de pessoas. E mais: desde 2015 até outubro último, o número de corretores credenciados no país teria aumentado em 30%, segundo o Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci), entidade que reúne os conselhos regionais. 

A tendência de crescimento mostra que o mercado sinaliza também para um perfil diferenciado, com forte aderência às novas tecnologias digitais ao corretor do futuro.

Um levantamento do conselho paulista, feito em 2021, mostra que 84,8% dos corretores imobiliários entrevistados acreditam que vão estar totalmente imersos nos recursos digitais nos próximos três anos. E para três em cada quatro deles, as novas tecnologias vão impactar fortemente na realização de negócios. Somente 2,3% dos pesquisados avaliam que não haverá mudanças na profissão com a transformação digital e 1,6% não pretendem mudar seu formato de trabalho nos próximos três anos. 

Digitalização é aliada da corretagem

A digitalização, por outro lado, não deve eliminar a profissão na opinião de João Teodoro da Silva, presidente do Cofeci. “Desde a popularização da internet no Brasil, inúmeros portais têm se aventurado na intenção de substituir o trabalho humano de corretagem de imóveis”, argumentou num artigo publicado em outubro deste ano. “Todos sucumbiram. A mediação de negócios é fundamentalmente emocional”, completou. Segundo ele, algumas inovações incomodam. É o caso da participação de síndicos e porteiros como negociadores. E o mesmo acontece com a entrada de startups no nicho de corretagem.

Sessenta por cento dos corretores têm curso superior 

Em entrevista ao Habitability, João Teodoro destacou que entrantes como porteiros, síndicos e startups – em contraponto a corretores profissionais – devem ser contextualizados. No primeiro caso, ele lembra que a negociação de compra ou venda de imóveis exige conhecimento, principalmente pela burocracia brasileira. 

João Teodoro – Cofeci

Cerca de 60% dos profissionais credenciados ao sistema Creci-Cofeci têm curso superior, o que reforçaria o perfil consultivo necessário ao exercício da corretagem. No caso das startups, João Teodoro lembra que muitas atropelam as regras, em um mercado onde as regras são fundamentais. 

“O mercado imobiliário é mais complexo do que se aproximar duas partes, ou seja, quem quer vender e quem quer comprar”, resume João Teodoro. Ele destaca que existe a necessidade de conhecer a documentação necessária para as operações de compra e venda e só um profissional consegue fazer isso sem atropelar as regras. Para ele, a tecnologia veio somar e o corretor do futuro vai agregar cada vez mais recursos ao seu dia a dia. 

A pandemia, de acordo com o presidente do Cofeci, foi o divisor de águas, pois quem não se adaptou ao mundo virtual, dificilmente se manterá no segmento e será um corretor do futuro.  

Para o executivo, praticamente todo o profissional de corretagem imobiliária aderiu ao trabalho remoto em algum momento, e hoje eles são capazes de usar os recursos a seu favor como, por exemplo, fazer uma demonstração virtual para os clientes. A maioria dos profissionais, aliás, está usando essa tecnologia. 

Em grandes cidades como São Paulo e Belo Horizonte, a virtualização das visitas permitiu que um mesmo corretor pudesse oferecer um maior número de visitas ao comprador interessado. “Metrópoles têm o problema da locomoção em função do trânsito, restringindo as visitas a um número limitado por dia”, lembra. 

A parte documental foi outro salto quântico de otimização de tempo e aumento de produtividade para o corretor do futuro. Além de selecionar melhor os imóveis que serão eletronicamente visitados, o corretor atual pode organizar a papelada para o cliente usando apenas o smartphone ou notebook. Todo o processo foi virtualizado, inclusive a escrituração.

João Teodoro estima que, atualmente, 80% dos negócios são realizados dessa forma e 20% apenas permanecem essencialmente presenciais. “Apesar do avanço dos algoritmos, a empatia é primordial e não pode ser gerada por máquina”, argumenta o presidente do Cofeci. 

Empatia e tecnologia turbinam negócios do corretor do futuro

A empatia citada por João Teodoro pode se dar, inclusive, pelos meios eletrônicos. A experiência de Alex Tomasi de Souza, corretor de alto desempenho da MRV, comprova isso. Um dos negócios mais recentes fechados pelo profissional, que atua na Região Metropolitana de Porto Alegre, envolveu três horas de consultoria e uma hora efetivamente para a finalização do contrato. As primeiras horas aconteceram parte no celular e parte presencialmente, e não foram focadas no valor do imóvel, mas sim no atendimento das necessidades da cliente, que queria comprar o próprio apartamento e sair da casa dos pais. 

Alex Tomasi – Corretor

“Era uma venda difícil, mas eu foquei em atender as dores da cliente, orientando-a totalmente sobre as condições de financiamento e outros aspectos burocráticos”, detalha. “Fiz toda a aprovação online e usei o ouvido como principal ferramenta de trabalho”, revela. 

Tomasi, como é conhecido no segmento, acrescenta que a parte presencial aconteceu na loja com imóvel decorado, o que permitiu que a compradora concretizasse a noção de espaço do apartamento. “Nem toda a venda é demorada. Há processos em que o fechamento acontece em 30 minutos, inclusive em função do material virtual de suporte”, completa. 

A própria história de Tomasi é um indicativo do perfil do corretor do futuro, que usa a tecnologia a seu favor. Empreendedor, ele começou na carreira há seis anos e sem experiência efetiva. Focou no aprendizado, iniciando no plantão de vendas e a partir de uma lista fria de potenciais compradores. Logo percebeu que poderia usar as redes sociais a seu favor e hoje o Facebook (principalmente) e o Instagram são investimentos fixos mensais. É a partir deles que Tomasi capta boa parte dos clientes. “Estudei as melhores formas de anunciar nas redes, como incluir informações estratégicas e até a disposição das cores no material informativo”, informa. 

Entusiasta de influenciadores digitais do seu mercado e de outras áreas, Tomasi costuma se definir como um aprendiz contínuo. “Sem errar, ninguém aprende, então considerei isso desde o começo”, diz. Ele também levou a esposa para a área e hoje os dois formam um casal de corretores imobiliários.

O foco e o perfil empreendedor de Tomasi o levaram a uma situação singular: hoje ele trabalha menos e fatura mais. Atender aos clientes no final de semana é uma exceção, porque ele já se organiza durante a semana para o operacional e toca a parte burocrática quase que 100% do tempo usando um smartphone topo de linha. “É um investimento, porque não trava, permite o envio rápido de imagens e de documentos”, explica. O resultado? Mais de 300 imóveis vendidos em seis anos de corretagem, com um Valor Geral de Vendas (VGV) maior que R$ 50 milhões. 

Corretor do futuro usa tecnologia a favor, inclusive as redes sociais  

Também atuante em Porto Alegre e região, Viviana Rodrigues da Silva tem um perfil similar ao de Tomasi quando o assunto é tecnologia. Ela tem uma rotina de uso de redes sociais que, inclusive, envolve um investimento em agência especializada para gerenciar parte de seus posts no Facebook e Instagram. Viviana também adota um smartphone e um notebook de primeira linha para a gestão dos contatos captados. A consultoria permite que ela direcione os seus esforços para um tipo de cliente com maior potencial de fechamento.

Viviana Rodrigues – Corretora

“Comecei como quase todo mundo, a partir de listas de clientes e do atendimento do cliente em loja, no plantão de vendas. Depois passei a usar as redes sociais, o que inclui até o Tik Tok, eventualmente”, diz. Ela destaca que plataformas como o Sales Force também são grandes aliadas para ela, que atua na MRV. O volume de dados permite ampliar os contatos e refinar as formas de abordagem. Viviana usa o Whatsapp no contato inicial, e responde rápido. O aplicativo também é usado para envio de documentação e de imagens. 

Como nem todo cliente se adapta totalmente ao mundo virtual, Viviana lembra que o perfil consultivo do corretor imobiliário é fundamental no processo. “Às vezes, o fechamento acaba acontecendo na loja para mostrar o apartamento decorado, mas ele também acontece porque o contato presencial pode contar muito para algumas pessoas”, avalia. Para ela, o corretor imobiliário precisa entender que nem todo o cliente domina bem as ferramentas digitais e parte do trabalho consiste em orientá-lo a como enviar documentos por meios eletrônicos. 

“Nós não vendemos o imóvel, vendemos condições. Tem que ter um produto bom e que caiba no bolso do comprador. Não tem segredo, não tem milagre. Não uso o celular para lazer em hora de trabalho. O nosso negócio é trabalhar oito, dez horas por dia, com listas, com novas ferramentas digitais e outras tecnologias. E ter foco”, finaliza.