Que planeta queremos habitar?

Enquanto bilionários desistem da Terra e buscam habitações no espaço, ações como o Warka Water exigem trabalho duro para melhorar a vida das pessoas no planeta.

Por Felipe Cardodo dos Reis em 12 de outubro de 2021 2 minutos de leitura

Warka Water

Um novo capítulo pela corrida espacial está sendo criado. O que antes era um programa com investimento de dinheiro público, numa corrida de poder entre nações, passou a ser uma disputa comercial pela exploração do turismo espacial. Três bilionários lideram essa aventura. Bezos, Branson e Musk já investiram boa parte de suas fortunas no desenvolvimento desses negócios. Jeff Bezos comentou em uma entrevista “estamos no processo de destruir este planeta. Então penso várias décadas para frente, e esse é o trabalho mais importante de minha vida”. Boa parte desse investimento é para resolver questões fundamentais de sobrevivência: ar, água, comida e energia. Elementos abundantes e disponíveis no nosso planeta, mas que por uma questão de organização política e de interesses, não estão ao alcance de todos.

No planeta que Bezos jogou a toalha, 785 milhões de pessoas não têm acesso a água potável, 2 bilhões de pessoas (1 em cada 3 no mundo) não têm acesso a um banheiro. O tempo de 266 milhões de horas é gasto por mulheres e meninas na busca por água, todos os dias. A cada dois minutos uma criança morre de alguma doença relacionada a água. Diarreia é principal causa de morte infantil (1 em cada 3 mortes). Mas isso é um assunto chato, constrangedor, que algumas pessoas evitam tomar conhecimento. É muito mais interessante assistir a uma live com um Tesla preso em um foguete indo para a Lua, ou ver um bilionário excêntrico dando pirueta no espaço, não é mesmo?

Enquanto isso, a falta de acesso à água e ao saneamento básico custam quase 300 bilhões de dólares por ano.

Warka Water é resposta positiva

Em 2012, o arquiteto e artista italiano Arturo Vittori apresentou, durante a Bienal de Veneza, o projeto Warka Water. É um projeto transformador, cujo objetivo é levar condições mínimas de sobrevivência para comunidades remotas. A inspiração para o nome Warka vem de uma espécie de figueira gigante, nativa da Etiópia, onde as pessoas se reúnem para discutir temas relacionados aos interesses da comunidade.

Foi lá que, em 2015, depois de uma viagem do Arturo e presenciando o deslocamento que as pessoas faziam todos os dias em busca de água, na maioria das vezes contaminada, que instalamos o primeiro piloto: uma torre feita com estrutura de bambu, entrelaçada por uma malha de poliéster, com propriedade hidrofóbica e que reproduz o efeito lotus, possibilitando a captação de água da chuva, neblina e orvalho que condensam, e, por gravidade, caem em um recipiente que acumula o líquido. Em média, o sistema capta 100 litros de água por dia, dependendo das condições climáticas. Todo o processo de construção e montagem da torre é feito de forma artesanal, em conjunto com as pessoas da comunidade, não custando mais do que mil dólares.

Desde então, o projeto evoluiu, passando por várias transformações, ampliando as soluções de problemas como habitação, higiene e energia. Utilizando conceitos de biomimética, encontramos inspiração na natureza. A fauna e flora possuem meios específicos de sobrevivência, desenvolvendo capacidade para coletar água do ar e armazená-la para sobreviver em ambientes inóspitos. Os aspectos culturais, as tradições, os costumes, a arquitetura, tudo é levado em consideração no processo de criação. O Warka Water está presente no Haiti, Camarões, Etiópia, Madagascar, Colômbia, Índia e Sumba.

Neste mês, a minha filha completa 4 meses de vida e eu quero que ela se lembre do pai como um cara que tentou melhorar a vida de algumas poucas pessoas, e não do cara que jogou a toalha.

* Felipe Cardoso dos Reis é gerente de inovação para Desenvolvimento Corporativo da MRV&CO.