Autoconstrução: problema ou solução?

Para além dos problemáticos ‘puxadinhos’, autoconstrução pode ser solução para o déficit habitacional ao possibilitar o engajamento comunitário.

Por Redação em 11 de maio de 2023 4 minutos de leitura

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O déficit habitacional não se resume à falta de moradia. Segundo dados da Fundação João Pinheiro (FJP) há no Brasil 25 milhões de moradias precárias. Dessas, 11 milhões têm problemas construtivos, como falta de pisos ou forros, paredes rachadas, ausência de banheiro e muitas pessoas ocupando o mesmo cômodo. Os números refletem a luta por aqueles que buscam um lugar para chamar de seu, mas não têm recursos para realizá-lo da forma adequada, dando origem aos “puxadinhos”. Por falta de conhecimento ou dinheiro, a autoconstrução, sem a contratação de serviços de profissionais técnicos, como arquitetos ou engenheiros, é uma prática adotada por 82% dos 50 milhões de brasileiros que já fizeram obras de reformas ou construção, como mostra um relatório realizado pelo Instituto Datafolha em parceria com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU).

Pela sua complexidade multifatorial, mitigar essa situação, e seus efeitos sobre a qualidade de vida da população, demanda ações de todos os lados – de políticas públicas e programas habitacionais à participação social. É neste ponto que a autoconstrução pode se tornar aliada.

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Autoconstrução pelo mundo

O problema da autoconstrução não é uma realidade exclusivamente brasileira. Em vários lugares do mundo, pessoas constroem diariamente sem ajuda de profissionais ou órgãos responsáveis. Segundo o arquiteto e ativista italiano Carlo Ratti, de 50 construções criadas no mundo, apenas 1 é desenhada e gerida por profissionais capacitados para tal, como arquitetos ou engenheiros.

Medellín – Colômbia (Foto: Urban-Think Tank/Daniel Schwartz)

Para reverter esse quadro na Índia, ele se inspirou na lógica “se não pode contra eles, junta-se a eles” e criou um projeto habitacional de baixo custo, que visa educar e capacitar as comunidades locais a construírem suas moradias. Desenvolvido para a empresa sem fins lucrativos WeRise, ele traz um modelo construtivo pré-fabricado e de baixo custo, cujas obras podem ser executadas pela própria comunidade a partir de uma capacitação prévia.

No Paquistão, a ONG Orangi Pilot Project segue a mesma lógica de explorar o potencial da autoconstrução como solução. O projeto ajuda comunidades a construírem suas casas a partir de oficinas, que, além da autoconstrução, propõe soluções para sistemas mais complexos, como redes de água e esgoto e reciclagem de lixo.

Partindo de um princípio mais tecnológico mas com o mesmo fim, um projeto colaborativo no Peru, batizado de MUTUO, traz para a realidade o sonho de quem quer construir um lar. Ele funciona como uma plataforma online que conecta profissionais de arquitetura a pessoas que necessitam e querem construir uma casa. Através desta ferramenta, eles conseguem garantir que tudo seja feito dentro das medidas de segurança necessárias.

Participação social

Foto: Divulgação – Teto Brasil

Uma das respostas da sociedade ao déficit habitacional são os projetos sociais protagonizados por Ongs. Sob diferentes perspectivas, elas visam fortalecer o desenvolvimento comunitário. 

Com a ajuda de voluntários que trabalham pessoalmente na construção de moradias de alvenaria de quatro módulos, com capacidade para oito pessoas, e  contribuição financeira, a Construíde beneficia famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social. Até 2021, já havia construído 61 casas em São Paulo, Sergipe, Goiás e Paraná. 

Com projetos desenvolvidos em 24 estados, a Habitat Brasil já transformou a vida de quase 200 mil pessoas, construindo casas completas, que incluem infraestrutura de água e saneamento, através do programa Minha Casa Minha Vida.

Já a chilena Teto atua em 18 países na América Latina, com mais de 1 milhão de voluntários, sendo 45 mil só no Brasil. Ao lado de moradores, os voluntários trabalham na construção de casas emergenciais pré-moldadas, feitas de madeira de pinus certificada, com 15m² a 18 m².

Com foco em crianças e adolescente, a Décor Social foi criada em São Paulo para promover moradia saudável e acolhedora por meio da reforma e decoração de abrigos. Com o auxílio de voluntários especializados em arquitetura, decoração e paisagismo, a ONG viabiliza projetos de revitalização dos espaços físicos e instalações de entidades assistenciais e filantrópicas.

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Mulheres no foco

Segundo a Fundação João Pinheiro (FJP), as mulheres são as mais afetadas pelos problemas habitacionais, impactando, inclusive, em situações de submissão a situações abusivas e de violência doméstica. De acordo com a pesquisa realizada pela instituição, 60% das moradias inadequadas são ocupadas por mulheres, um total de 15 milhões.

Foto: Lucas Monteiro/Arquitetura na Periferia

São por razões como essa que a Ong Arquitetura na Periferia reúne e capacita as pessoas do sexo feminino para construir e reformar a própria casa. Com atuação em Belo Horizonte/MG, o projeto tem como objetivo apresentar técnicas de projeto e planejamento de obras, além de oferecer microfinanciamento para que essas mulheres conduzam as reformas de suas moradias.