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Cezar Taurion: Smart City é um lugar onde a tecnologia é usada em prol de todos
Especialista em inovação, sócio e head de Transformação Digital da Kick Adventures dá uma perspectiva humana ao uso da tecnologia.
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Redação em 22 de agosto de 2022 4minutos de leitura
A tecnologia não muda o mundo. Pessoas mudam o mundo por meio da tecnologia. Esta é a ideia central que move o trabalho de Cezar Taurion. O atual sócio e head de Transformação Digital da Kick Ventures, evangelista de tecnologia e inovação desde o final da década de 1970, decreta: sem os seres humanos, as inovações não servem de nada.
Para o executivo, que passou 20 anos liderando a área de Tecnologia Aplicada da IBM, “a cidade inteligente é aquela que permite que você tenha qualidade de vida adequada e viva bem. A inovação precisa ser pensada para o bem das pessoas e para resolver os problemas significativos que afetam todo mundo”. No entanto, a verdadeira resposta para isso, por meio da inovação, saiu dos chips e das conexões ultra rápidas e está nas pessoas, mas ainda estamos tateando as respostas quando se trata da melhor forma de aplicar as técnicas do digital para a sociedade como um todo. Para ele, por mais que aplicativos e smartphones estejam abrindo o caminho para democratizar o acesso ao digital, ainda há uma grande jornada a seguir.
Pensar no ganho de escala para além do retorno financeiro é um dos grandes desafios da inovação, principalmente quando se trata de cidades. “Aquelas cidades fantásticas na Coreia ou em Dubai ainda são um MVP (da sigla em inglês para Produto Mínimo Viável). São apenas construções para mostrar que é legal. Não representa todo mundo”, disse. “A tecnologia vai ser o meio para a mudança, o ponto é como mobilizamos a sociedade para isso. Até porque, nenhuma mudança vem de cima para baixo”, provoca.
Tecnologia sem humanos?
O primeiro ponto para responder à pergunta feita por Taurion é entender que as pessoas precisam ser o centro e o foco da produção inovadora. “Não adianta criar uma tecnologia, resolver um problema, se as pessoas não toparem usá-la”, resume o executivo.
Atualmente, a gente já sente parte dos efeitos da transformação digital no nosso dia a dia. Os smartphones são um exemplo prático disso: o que antes era feito em casa, com ajuda de computadores, agora é feito com dois toques em um aplicativo. Há uma preocupação, no entanto, sobre até onde a web pode nos levar. Filósofos como Yuval Harari levantam a possibilidade da inteligência artificial substituir a mão de obra humana, criando um novo tipo de pirâmide social.
Para Taurion, a inteligência artificial poderá ser usada para substituir tarefas repetidas que não deveriam ser feitas por humanos, mas ainda precisaremos de tarefas pensadas e executadas por humanos. “Não vejo a tecnologia substituindo humanos, mas complementando-os”, afirma o especialista. Hoje em dia a máquina ainda “demora para se adaptar a situações insólitas” e só resolve problemas que já encontrou antes. “Os humanos ainda sabem muito mais”, acrescenta. A questão é muito mais sobre como as pessoas vão responder à máquina do que o contrário. Ou seja, como os países vão se adaptar a essa nova “inteligência aumentada”? E como é possível garantir que a execução de tais novidades não seja feita para apenas parte da população?
Tecnologia para o bem coletivo
É na união e na equidade das oportunidades que a discussão aflora naturalmente para as cidades. É nas cidades que ela pode ser resolvida: a tecnologia usada para “o bem maior”, afirma o ex-diretor da IBM, é aquela que pensa em termos de infraestrutura e de vias de equalizar a vida de todos os bairros, não apenas de alguns.
“Não adianta ter um condomínio super smart enquanto os vizinhos moram em comunidades que não têm coleta de lixo. Onde nem mesmo os aplicativos de entrega funcionam direito”, diz Taurion, ao lembrar que se a tecnologia não for para todos, ela não será inovação. “Será uma cidade distópica, onde pessoas andam de carro elétrico blindado em meio a zumbis”, conta o especialista, que também é fã de ficção científica.
As possibilidades dentro do ambiente urbano são muitas. Dois exemplos que Taurion dá estão na ordem da infraestrutura e da saúde. Na parte de saneamento básico, os sensores digitais podem ser usados para medir a pressão dos canos e apontar quais são os lugares de perda de água. Na saúde, a telemedicina pode tornar a ida ao médico mais acessível para pontos longe do centro. “Na área de dermatologia, por exemplo, os especialistas ainda estão concentrados nas grandes capitais. E é possível, a partir de câmeras do celular, se fazer alguns tipos de exames a distância. É possível ter uma medicina mais preventiva e preditiva do que corretiva”, conta.
Para isso tudo funcionar, no entanto, os entes públicos precisam estar preparados com ambientes mais centralizados de informação digital. A cidade do Rio de Janeiro, lembra Taurion, já fez isso a partir de um aplicativo de monitoramento e uma central única de chamada. Um aplicativo foi lançado para que os cidadãos mandassem fotos de ocorrências para a prefeitura corrigir. “Mas quando as pessoas começaram a não ter mais respostas, deixaram de usá- lo”, lamenta.
O exemplo ilustra outro assunto difícil de lidar, principalmente em terras brasileiras: os poderes. “No final, acaba batendo nas vontades e interesses que fazem as coisas acontecer. A tecnologia tem todo o potencial, mas o negócio é como canalizar. Se quer saber, ainda não temos resposta para isso, se tivéssemos, já teríamos feito”, complementa.
Inovação como plano B
Falar de futuro e de tecnologia está no dia a dia de Taurion desde o início dos anos 1970 e tudo isso por causa de uma “segunda opção”. Na época, ainda na graduação de economia, ele não conseguiu o seu trabalho dos sonhos: pilotar na Varig. “Meu sonho era entrar na Varig. Mas eu sou míope. E, na época, a Cia não contratava pessoas com o grau de miopia que eu tinha”. Foi um professor da faculdade que lhe apresentou o computador, um mainframe. “Eu achei incrível e mergulhei nisso”, conta o executivo.
Desde então, “olhar para a frente” tem sido uma das principais funções de Taurion. Seja à frente da IBM, investindo em startups ou na academia. “Tenho que olhar sempre para a frente, mas ser racional. Saber equilibrar o copo meio cheio e meio vazio. Não dá para achar que o mundo todo vai mudar com a tecnologia, mas também não dá para cair no ceticismo. Precisa ser racional. Até agora tem dado certo porque ainda estou no mercado”, brinca.
A aposta de Taurion no momento é na democratização do acesso e no aumento da educação digital por todos os meandros sociais. Essa é a forma de garantir que a inovação não fique fechada em apenas uma área do mundo. “Estamos fazendo tecnologias incríveis, como carros elétricos, mas estamos beneficiando uma parcela muito pequena da população. Eu acho que a tecnologia tem que ser pensada para democratizar. E isso só será feito sob a pressão da sociedade”, aponta o executivo.
“É difícil usar a bola de cristal. O que nós vemos, cada vez mais, é a tecnologia se disseminando como parte da sociedade. Ainda é muito heterogênea essa distribuição: nem todo lugar é o Vale do Silício. E precisamos saber que o Vale do Silício não pode decidir pelo mundo todo”, finaliza o expert.
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