Existe cor em São Paulo?

Fotógrafo Rafa Rojas mostra que sim. Com diversos trabalhos que conecta a cidade e as artes, artista mostra a importância dessa relação.

Por Ana Cecília Panizza em 3 de junho de 2024 5 minutos de leitura

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Rafa Rojas (Foto: Lucas Mello/MIS)

A cidade de São Paulo é descrita pelo cantor e compositor brasileiro Criolo na música “Não existe amor em SP” como “Um labirinto místico/Onde os grafites gritam”. Um lugar com pouca vida, metáfora de um buquê de flores – que, por estarem reunidas no arranjo, estão mortas, extraídas de seu habitat. De fato, quem se aproxima de São Paulo pela estrada se vê adentrando em um emaranhado cinza, com excesso de pedras e pouca vivacidade. Quem chega pelo aeroporto de Congonhas, cravado no meio de bairros residenciais, avista – do alto – um território totalmente tomado por construções verticais em tons de grafite. Como encontrar cores nesse cenário? O fotógrafo e editor Rafa Rojas se impôs esse desafio. Saiu às ruas da cidade e concebeu a série “Cores de São Paulo”, escolhida para abrir a temporada de 2024 do projeto “Nova Fotografia”, do Museu da Imagem e do Som (MIS), que selecionou seis novos fotógrafos para exposição individual no espaço cultural.  

Foto: Rafa Rojas

A série de Rojas, de um gênero chamado “fotografia de rua”, propõe uma nova visão da cinza São Paulo a partir de caminhos que exploram a arquitetura da cidade e revelam o lado colorido da metrópole no registro do espaço urbano. Na mostra, que ficou em cartaz entre 7 de fevereiro e 14 de abril de 2024, Rojas compartilhou 20 imagens (de um total de 100 que ele registrou para o projeto e que devem compor um livro).

As fotos revelam percepções do artista em busca de poesia na geometria presente no dia a dia dessa cidade, sob uma perspectiva que encontra – e destaca – cores vivas. As imagens retratam locais como o bairro da Liberdade e o Parque Minhocão. Destacam cenas triviais como um vendedor de algodão-doce e uma pessoa com um guarda-chuva colorido, que, sob as lentes de Rojas, ganham dimensões artísticas e poéticas. 

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As ruas são recorrentes na obra de Roja. Em 2023 ele foi editor do livro “Minhocão de cima a baixo”. O fotógrafo também participou das exposições “Mirares – longevidade” e “Mirares – fotografia urbana”, em 2021 e 2023, respectivamente. Em 2021 publicou o livro “Underground stories”. No ano seguinte, cocriou a revista Imagem Vertigem. Roja já teve trabalho publicado nos periódicos LensCulture, Noice Magazine, Street Photography Magazine, PhotoVogue, The Avenue Magazine, BROAD Magazine, Reset Chile, Revista Ampolleta Roja, além de outras publicações e exposições brasileiras. Entre suas influências estão o cineasta Wes Anderson e o fotógrafo Robert Frank, famoso pela obra fotográfica “The Americans”, com um retrato coletivo dos cidadãos no dia a dia das ruas. Na entrevista a seguir, concedida ao Habitability ele fala da sua relação com as cidades: 

Quando e como veio a ideia de montar a série “Cores de São Paulo”?

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Painting in Red (Foto: Rafa Rojas)

Rafa Rojas: eu já fazia fotografia de rua há alguns anos e já tinha feito algumas fotos que fazem parte do projeto, mas a criação da série foi no início de 2021. Eu estava há um tempo sem fotografar na rua por conta da pandemia. E, em uma saída ao Parque Minhocão [região central da cidade de São Paulo], fiz a foto “Painting in Red”, uma cena bem incomum para a cidade de São Paulo – um prédio colorido (vermelho) e uma cena minimalista. A partir disso, passei a buscar, dentro da cidade, imagens que tinham a mesma linguagem e a proposta de contrastar com a ideia que se tem de São Paulo (cinza e caótica).

Foi difícil encontrar cores nesta cidade? E de encontrar cenas a serem fotografadas? Como foi esse processo?

Rafa Rojas: é muito difícil, sim, não só pela falta de cores na cidade, como também pela maneira como a cidade se transforma, e nem sempre para melhor. Alguns bairros mais tradicionais, que se destacavam pela arquitetura antiga de casas e fachadas mais coloridas, têm sido derrubados para construção de prédios cinzas, beges ou envidraçados. Isso aconteceu também no Minhocão, que é cenário de boa parte das fotos do projeto. Os grafites, que também são personagens presentes nas minhas fotos, duram pouco nas paredes: muitas vezes são pintados (de cinza) ou removidos. Na região central ou mais turística da cidade, se vê pouca arte e cor.

Não tenho roteiro, normalmente estou com a minha câmera e, quando encontro alguma cena que acho interessante, acabo registrando. Alguns dias saio com o objetivo de fotografar, mas também nada programado: vou para alguma região e saio caminhando pela cidade, muitas vezes sem rumo.

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Você pretende exibir a série “Cores de São Paulo” em outros locais?

Foto: Rafa Rojas

Tenho vontade de apresentar a série em outros locais, sim. No MIS pude expor 20 imagens de um projeto que hoje conta com mais de 100 fotos produzidas. Em 2025 vou iniciar o trabalho de produção do livro “Cores de São Paulo”, então, até lá, a ideia é continuar a produzir material para essa série. Minha vontade também é poder apresentar essas imagens novas a cada exposição. Para isso precisamos ter mais espaços e investimentos para que artistas independentes, como eu, possam exibir seus trabalhos.

Para você, como a arte (a céu aberto e dentro de espaços culturais) e a arquitetura podem ajudar a melhorar a experiência de se viver em grandes cidades? 

Rafa Rojas: a arte é fundamental para melhorar a experiência de vida das pessoas em qualquer lugar do mundo, especialmente em cidades como São Paulo, onde as pessoas vivem rotinas insanas e estressantes. Precisamos de mais espaços dedicados à arte na nossa cidade. A arquitetura tem a capacidade de transformar os espaços urbanos e, de mãos dadas com a arte, poderia transformar para muito melhor o aspecto visual de São Paulo. Seria interessante ver mais projetos coloridos e criativos ao invés desse boom de prédios desinteressantes que têm tomado conta da cidade.