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Filtro de água à base de sol? Solução criada por startup brasileira dá acesso à água potável
Projeto criado por jovem estudante oferece a famílias do sertão nordestino dispositivo que purifica água usando apenas a luz do sol.
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Redação em 28 de novembro de 2023 4minutos de leitura
Foto: Divulgação/SDW
Anna Luísa Beserra era apenas uma adolescente de 15 anos quando foi impactada por “Vidas Secas”, livro de Graciliano Ramos. Publicada originalmente em 1938, a obra traça um retrato da migração nordestina causada pela falta de chuva. Foi por meio da obra que a jovem, natural de Salvador/BA, descobriu os problemas causados pela escassez de água e, a partir disso, teve uma ideia: e se existisse um filtro que permitisse purificar a água usando a luz solar? Estava ali o embrião do projeto Aqualuz, que já beneficiou mais de 20 mil pessoas em todo o Brasil.
Além de contribuir para reverter o cenário de atraso histórico na infraestrutura de saneamento básico no país, o projeto de Anna Luísa dá autonomia às famílias e se destaca pela efetividade de uma solução simples: uma caixa de aço inoxidável com uma tampa de vidro, que permite a incidência da radiação solar; e um sensor termossensível que muda de cor para indicar quando o processo de desinfecção da água é finalizado. O usuário, então, enche o equipamento com água e o deixa exposto ao sol por, pelo menos, quatro horas. Após a alteração da cor do sensor, a água pode ser retirada e resfriada para o consumo. E a solução ainda pode durar até 20 anos apenas com limpeza de água e sabão sem precisar de manutenção externa ou elétrica.
A tecnologia desenvolvida permite às famílias uma economia de R$ 600 por ano, na medida em que deixam de gastar com fervura de água, tratamentos médicos e medicamentos para combater as chamadas doenças de veiculação hídrica, tais como esquistossomose, disenteria e Doença de Chagas.
Do ensino médio ao reconhecimento internacional
A ideia que deu origem ao Aqualuz surgiu quando Anna ainda cursava o ensino médio e viu o cartaz do Prêmio Jovem Cientista, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que tem uma categoria voltada para a etapa escolar. Naquele ano, o tema foi “Água – Desafios da Sociedade”.
Embora não tenha ganhado a premiação na época, a ideia ganhou força até sair de fato do papel quando a jovem ingressou na Universidade Federal da Bahia (UFBA), no curso de biotecnologia, onde se formou. A partir de um intercâmbio entre a universidade que ela cursava e estudantes da Universidade Federal do Ceará, ela conseguiu apoio para materializar a ideia, que deu origem também à startup SWD – Sustainable Development and Water.
Criada em 2013 com a estudante cearense Letícia Nunes, a SWD tem foco no desenvolvimento de tecnologias avançadas para garantir o acesso à água potável e saneamento de qualidade para as regiões mais remotas do país.
Atualmente, o projeto já contribuiu para economizar R$ 80 milhões em saúde, saneamento e educação para a sociedade, com presença no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Maranhão.
Pelo impacto positivo causado na qualidade de vida das pessoas que passaram a ter acesso à água de qualidade, foi premiado pela Organização das Nações Unidas (ONU), tornando Anna, aos 21 anos de idade, a primeira brasileira a conquistar o prêmio Jovens Campeões da Terra, honraria que reconhece pessoas de 18 a 30 anos que estão empreendendo com impacto social.
Não pode parar
A meta da SDW é impactar 1 milhão de pessoas até 2025 por meio do projeto que está sendo conduzido junto à Organização de Conservação de Terras (OCT). Para isso, vai poder contar com um aporte de R$ 2,2 milhões recebido da Seguradora Zurich e do Instituto BRK.
Além da doação dos equipamentos, a iniciativa contempla um amplo cronograma que envolve o mapeamento das famílias que recebem o dispositivo gratuitamente e o trabalho lúdico e educativo junto às comunidades, visando ressaltar a importância do tratamento da água e a forma correta de utilizar o sistema, bem como a mensuração dos resultados.
Saneamento é básico
De acordo com o Instituto Trata Brasil, mais de 33 milhões de brasileiros vivem sem abastecimento de água potável. Segundo o Painel Saneamento Brasil, na região Norte do país, 40% da população (cerca de 7,1 milhões de pessoas) não têm acesso à água limpa. No Nordeste, são 25,30% ou 14,2 milhões de pessoas.
A precariedade do saneamento básico tem implicações imediatas na vida principalmente de crianças. Conforme dados do DataSUS, em 2021 foram mais de 45 milhões de internações por doenças associadas à falta de saneamento. Em 2020, 3,46 mil escolas informaram não ter qualquer forma de distribuição de água, aponta relatório “Cenário da Infância e Adolescência no Brasil 2022”, da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq).
A privação da vivência de uma infância plena e digna é um dos problemas mais prejudiciais ao futuro do país. De olho neste desafio, foi lançada no último mês de agosto, pelo Governo Federal, a terceira versão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que irá contemplar nove eixos de investimentos em infraestrutura, entre eles, “Água para Todos” e “Cidades Sustentáveis e Resilientes”. Estão previstos aportes de cerca de R$ 1,7 trilhão em todos os estados.
O Brasil tem metas definidas para universalização dos serviços básicos para serem cumpridos até 2033, estabelecidos pelo “Novo Marco Legal do Saneamento Básico” (lei 14.026/2020). Até lá, todas as localidades do país devem garantir que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e coleta de esgoto. No entanto, segundo o estudo “Avanços do Novo Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil” (2023), lançado pelo Instituto Trata Brasil em julho, o país precisará dobrar os investimentos em saneamento se quiser alcançar a meta até a data limite. O relatório aponta que serão necessários o equivalente a R$ 44,8 bilhões ao ano. Ou seja, ainda há muito a ser feito.
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