Justiça climática: o que é e como afeta as cidades?

Conceito que ganhou força no debate sobre sustentabilidade, a justiça climática pede igualdade e proteção aos mais vulneráveis

Por Redação em 13 de fevereiro de 2023 4 minutos de leitura

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Das áreas remotas da Antártida até o topo dos prédios mais altos de Dubai, a crise climática atinge a todos. Isso não significa, no entanto, que os efeitos sejam igualmente distribuídos pelo mundo. Pessoas em situações mais vulneráveis de pobreza, miséria e fome, assim como comunidades localizadas em espaços de infraestrutura precarizada, tendem a sofrer mais com os eventos extremos do que o resto da população. E é aí que entra o conceito que tomou conta do debate sobre transição energética, com razão: a justiça climática.

A justiça climática é uma das principais pautas de jovens ativistas, como Greta Thunberg e a brasileira Amanda Costa. Foi em nome do movimento Climate Justice, inclusive, que Greta ficou conhecida, em 2018, por seu discurso emocionado na Organização das Nações Unidas. O movimento busca, de acordo com a Alana, uma divisão mais justa dos investimentos e responsabilidades no combate à emergência climática. E as cidades serão o principal espaço para que o termo se torne realidade. 

O que é justiça climática?

A justiça climática procura colocar as pessoas e as questões éticas como prioridade no combate ao aquecimento global. O conceito funciona partir do entendimento de que os países e regiões com maior desenvolvimento causam maior impacto nas emissões de gases de efeito estufa, mas, ao mesmo tempo, têm uma população menos vulnerável aos estragos que o aquecimento global pode trazer.

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De acordo com relatório do Stockholm Environment Insitute, o 1% mais rico da população global causou o dobro de emissões de carbono do que os 50% mais pobres, nos últimos 25 anos. Nas contas da Unicef, os 50% mais pobres foram responsáveis por menos de 10% das emissões nos últimos anos.  Enquanto isso, 3 bilhões de pessoas no mundo vivem em lugares vulneráveis à crise climática. Em outras palavras: quem está pagando os custos do aquecimento global não são aqueles que contribuíram para a devastação do meio ambiente.  

A preocupação do movimento é com o “MAPA”, sigla de “Most Affected People and Areas”. São pessoas do sul global, de territórios e comunidades marginalizadas. E aí entram principalmente as mulheres negras, a população LGBTQI+, minorias raciais e as populações originárias. Colocar a perspectiva daqueles que podem ser mais afetados é essencial quando se fala de justiça e equidade. 

“A mudança climática está profundamente entrelaçada aos padrões globais de desigualdade. As pessoas mais pobres e vulneráveis sofrem o impacto das mudanças climáticas, mas contribuem menos para a crise. À medida que os impactos aumentam, milhões de pessoas vulneráveis enfrentam desafios desproporcionais, como eventos climáticos extremos, efeitos na saúde, alimentos, água e segurança dos meios de subsistência, migração e deslocamento forçado, perda de identidade cultural e outros riscos relacionados”, indicou o World Bank.

Mas, e as cidades?

Os impactos das mudanças climáticas representam riscos únicos para áreas urbanas com alta densidade populacional. E, como é esperado que até 70% da população mundial viva em cidades até o final de 2030, o centro da ação climática terá que ser nas regiões mais urbanizadas. A prioridade é que os espaços urbanos consigam ajudar a mitigar os riscos de eventos extremos e proteger a vida de seus cidadãos mais vulneráveis.

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As pessoas que moram na “cidade informal”, ou seja, em espaços mais distantes dos investimentos públicos e privados, são aquelas que, invariavelmente, sofrerão mais em casos de enchentes, excesso de calor (ou frio), tufões e falta de água. No Brasil, 10% da população vivem em favelas e apenas um entre quatro moradores de aglomerações urbanas vive bem. 

De acordo com o WRI Brasil, quase metade da população em 15 grandes cidades no Sul global não tem acesso a água encanada confiável, e 62% do esgoto e do lodo fecal são gerenciados de forma insegura. Mais de 1,2 bilhão de habitantes das cidades – um em cada três globalmente e dois em cada três em países de baixa renda – estão desassistidos, sem acesso a um ou mais serviços urbanos básicos.  

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Só descarbonizar não é a resposta

Pode parecer um paradoxo, mas para lutar contra a mudança climática, o tema que as cidades precisam pensar menos é… na mudança climática. Reduzir as desigualdades que os moradores enfrentam no acesso a habitação digna, água limpa, saneamento básico, eletricidade, transportes e oportunidade de trabalho, indica o WRI Brasil, é uma das mais poderosas formas de se atingir uma ação climática nas cidades.  

Na ótica da justiça climática, as pessoas devem estar sempre no centro.

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Se uma cidade coloca apenas o meio ambiente no centro das suas políticas, existe um grande risco de esquecer das demandas da população. Um exemplo dado pelo World Bank: políticas que expandem o transporte público ou a precificação do carbono podem tornar a tarifas de transporte público mais altas, o que pode impactar desproporcionalmente as famílias mais pobres.

“Da mesma forma, se não forem elaboradas, em colaboração com os beneficiários e as comunidades afetadas, abordagens sobre como limitar as atividades florestais a determinadas épocas do ano, existe o risco de impactar adversamente as comunidades indígenas, que dependem das florestas o ano todo para sua subsistência”, diz o World Bank. 

“Buscar a justiça climática significa combater a injustiça social, econômica, intergeracional e ambiental. A interseccionalidade desses desafios deve ser reconhecida para abordá-los de forma holística. Por exemplo, alguns projetos climáticos, inadvertidamente, criam injustiças climáticas quando as comunidades locais são deslocadas por uma iniciativa de conservação ou de geração de energia renovável”, indicou a Unicef.

Veja também o episódio 24 do podcast Habitability: