Microcomunidades são alternativa para reintegração social
De Atlanta a São Paulo, microcomunidades oferecem não apenas abrigo, mas uma chance de recomeço e reintegração social.
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Redação em 15 de outubro de 2024 5minutos de leitura
Imagem gerada por Inteligência Artificial
A invisibilidade social afeta milhares de pessoas que são privadas das condições básicas de sobrevivência. Nos Estados Unidos, por exemplo, o número de pessoas em situação de rua era 653 mil, em 2023, um aumento de 12% em relação aos 580 mil registrados em 2020. Este aumento é particularmente significativo quando comparado ao Brasil, que até agosto de 2023 tinha 227.087 pessoas nessa condição, segundo o Ipea. Embora a população dos Estados Unidos seja apenas 1,6 vezes maior que a do Brasil, o número de pessoas sem-teto nos EUA é quase três vezes superior ao registrado no Brasil.
Após anos enfrentando um aumento no número de desabrigados e tentativas falhas de solução, autoridades nos EUA estão mudando de tática. Agora, eles preferem construir microcomunidades em vez de abrigos tradicionais. Essas pequenas comunidades são mais rápidas e baratas de estruturar e oferecem mais estabilidade.
Além de cumprirem o papel de lar, elas são projetadas para serem integrativas, incluindo serviços complementares que abrangem desde saúde mental e assistência médica até capacitação profissional. Ou seja, o objetivo não é apenas fornecer abrigo, mas também apoiar os indivíduos no caminho para uma reintegração social completa e uma vida autônoma e segura.
A mudança de paradigma reflete uma evolução no entendimento e no tratamento da questão dos desabrigados, representando uma esperança renovada de abordar efetivamente uma das mais persistentes questões sociais não apenas nos EUA, mas no mundo todo, incluindo o Brasil.
Reimaginando o abrigo com microcomunidades sustentáveis
No coração de um bairro central de Atlanta, um antigo estacionamento foi transformado em um refúgio inovador para pessoas que viviam em situação de rua. O projeto, chamado The Melody, transformou contêineres de transporte em uma microcomunidade acolhedora.
O que antes era um estacionamento agora se assemelha a um pequeno oásis urbano. O asfalto deu lugar a grama artificial, enquanto vasos com plantas e cadeiras decoram o espaço. Há até um parque para cães, oferecendo um ambiente mais amigável e confortável para os moradores. Os contêineres foram convertidos em 40 apartamentos no estilo estúdio, cada um equipado com uma cama de solteiro, unidade de climatização, escrivaninha, micro-ondas, geladeira pequena, TV, pia e banheiro.
Já em Denver, Colorado, foram inauguradas três microcomunidades, totalizando quase 160 unidades, em cerca de seis meses, com um custo médio de US$ 25 mil por unidade, segundo o prefeito Mike Johnston. Além disso, o governo local transformou cinco hotéis em moradias para pessoas que anteriormente estavam desabrigadas. Em comparação com as microcomunidades, as mil unidades de hotel convertidas tiveram um custo médio de US$ 100 mil cada. Cada microcomunidade oferece uma gama de comodidades, incluindo banheiros, chuveiros, máquinas de lavar e pequenos parques para cães. Além disso, existem cozinhas disponíveis no local, embora o Exército da Salvação realize a distribuição de refeições.
Os programas de Atlanta e Denver estão projetados como trampolins para a inserção no mercado de trabalho e para a obtenção de moradias mais estáveis. Em Denver, por exemplo, mais de 1,5 mil pessoas foram realocadas para moradias. A meta é reavaliar a situação de todas as pessoas em seis meses, com o objetivo de ajudá-las a avançar para opções de moradia permanentes.
Outras cidades dos Estados Unidos também estão adotando soluções semelhantes. Em Austin, Texas, foram criadas três vilas de “casas minúsculas” para abrigar pessoas sem-teto. Em Los Angeles, um novo complexo residencial de 232 unidades foi construído utilizando contêineres de transporte empilhados em dois prédios de três andares.
Microcomunidades são o primeiro passo
Essas iniciativas representam uma mudança significativa em relação às políticas anteriores, que se concentravam em abrigos temporários e na constante relocação de acampamentos de um quarteirão para outro. Esse modelo resultava em dificuldades para manter os residentes conectados a serviços essenciais e no caminho para uma moradia permanente.
Em contraste, as microcomunidades de Denver e Atlanta oferecem um modelo centralizado e integrado de apoio: os residentes têm acesso a uma gama abrangente de serviços, incluindo gerenciamento de casos, aconselhamento, terapia para saúde mental e abuso de substâncias, além de orientação sobre moradia.
Também recebem assistência em áreas diversas, como treinamento de habilidades vocacionais e suporte para necessidades pessoais, como a obtenção de novos aparelhos dentários. Em entrevista ao portal Fast Company, Michael Rich, professor de ciência política da Emory University e especialista em política habitacional, descreveu o programa The Melody e iniciativas semelhantes como uma “abordagem muito promissora, viável e econômica” para enfrentar a falta de moradia. Rich destaca, entretanto, que, apesar de representar um avanço significativo, a moradia de transição é apenas o primeiro passo em direção a uma solução de moradia permanente.
Moradias modulares para um novo começo
A cidade de São Paulo também lançou um programa semelhante com o projeto Vila Reencontro, que oferece moradias modulares para pessoas em situação de rua. Originalmente previsto para o bairro Bom Retiro, o projeto agora possui 10 unidades habitacionais nos bairros do Canindé, República, Pari, Santo Amaro, Guaianases, Jabaquara e Sapopemba.
A iniciativa da Secretaria Municipal de Assistência Social (Smads) consiste na instalação de casas modulares feitas de contêineres metálicos. Cada unidade tem uma área de 18 m² e é equipada com quarto, cozinha e banheiro, podendo abrigar até quatro pessoas. As paredes e o forro das casas são confeccionados com materiais antichamas para garantir isolamentos térmico e acústico. O projeto inclui uma cozinha comunitária, refeitório, brinquedoteca, lavanderia, horta social e espaços para atendimentos socioassistenciais.
Inspirado no modelo Housing First, que foi desenvolvido na Europa e nos Estados Unidos, o Vila Reencontro visa garantir moradia imediata para a população em situação de rua. As unidades são prioritariamente destinadas a famílias, com ou sem crianças, e idosos que estejam vivendo em condição de rua há menos de dois anos.
A seleção dos beneficiários é feita com base em informações do Cadastro Único (CadÚnico) e dados cadastrais da Smads, como o SISRUA. As famílias podem permanecer nas moradias transitórias por um período de 12 a 18 meses e deverão participar de capacitações profissionais e outros atendimentos sociais para promover a autonomia e a reintegração à sociedade. Essas iniciativas, que vão além de soluções temporárias e fragmentadas, representam uma evolução no tratamento da falta de moradia, oferecendo não apenas um teto, mas também a chance de um novo começo.
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