Resíduos (e problemas) sólidos, os desafios do PNRS

Longe da meta de erradicar os lixões ainda este ano, 40% de todo o resíduo são inadequadamente descartados, o equivalente a 233 estádios do Maracanã lotados.

Por Redação em 18 de janeiro de 2024 6 minutos de leitura

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O Brasil ainda não alcançou a universalização do manejo ambientalmente adequado dos resíduos sólidos, mapeado pela Política Nacional dos Resíduos Sólidos – PNRS lançada há mais de 13 anos como resultado de mais de 20 anos de debate. De acordo com o relatório “Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2023“, divulgado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA) em dezembro, o país também está distante de atingir a meta estabelecida para a erradicação dos lixões até 2024, conforme determinado pela legislação vigente.

O estudo destaca que cerca de 33,3 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos foram inadequadamente descartados no ano de 2022, o que representa, aproximadamente, 40% de todo o lixo gerado no País. Para se ter uma ideia da magnitude do problema, a quantidade equivale a 11.362 piscinas olímpicas de lixo compactado ou 233 estádios do Maracanã lotados. Tendo como destino lixões a céu aberto, valas, terrenos baldios e córregos urbanos, esses resíduos colocam em risco a saúde pública e são uma ameaça direta ao meio ambiente.

A decomposição de materiais orgânicos produz gás metano, um dos principais gases causadores do efeito estufa, contamina o solo e corpos d’água, além dos impactos sociais decorrentes das condições do trabalho humano.

13 anos após a PNRS, como estamos?

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Segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU) 2023, apresentado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA), em 43% dos 3.947 municípios analisados, ainda persistem o descarte inadequado de resíduos.

A nova edição do levantamento criado para avaliar o grau de conformidade dos municípios brasileiros com as diretrizes e metas estabelecidas pela PNRS também mostra que cerca de 25% dos domicílios no Brasil não têm acesso a serviços de coleta regular pelo menos uma vez por semana, evidenciando uma distância considerável em relação à universalização prevista.

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O índice médio de reciclagem no país, por sua vez, permanece estagnado em modestos 3,5%, com a maior concentração desta prática nas regiões Sul e Sudeste do Brasil.

A conclusão é que, mesmo próxima de completar 14 anos de sua implementação, realizada após 21 anos de debate, a PNRS está longe de ser realidade: nenhuma cidade brasileira alcançou a pontuação máxima do ISLU, indicando pleno cumprimento da lei.

Da estagnação à circulação

O conceito de economia circular é estudado desde a década de 70 e tem sido defendido como ferramenta indispensável para o desenvolvimento sustentável por dar um tratamento global à questão dos resíduos sólidos, desde a forma como as matérias-primas são utilizadas, os produtos são desenvolvidos, utilizados e reutilizados, ampliando seu ciclo de vida, e somente depois reciclados ou descartados. Ou seja, trata-se de uma mudança de mindset e do modelo econômico global, muito além do escopo tratado na PNRS.

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De modo geral, ela promove uma gestão mais eficiente dos recursos naturais existentes, visando manter produtos, componentes e materiais em seu mais alto nível de utilidade e valor de maneira contínua, alinhando-se a um escopo econômico pautado pelo desenvolvimento sustentável. 

Segundo uma análise da Agência Brasil, 76% das indústrias brasileiras já incorporam de alguma forma a economia circular. Contudo, há um vasto potencial ainda não explorado. De acordo com esse estudo, 60% das indústrias reconhecem que as práticas de economia circular não apenas podem mitigar impactos ambientais, mas também contribuir para a geração de empregos, tanto nas próprias empresas quanto nas cadeias produtivas do setor. 

No entanto, 73% das empresas acreditam que a transição para a economia circular deve ser uma responsabilidade compartilhada entre governo, consumidores e iniciativa privada, evidenciando a complexidade e a necessidade de uma abordagem colaborativa, como prevista na PNRS.

Transformação do plástico

Desde o início da era da produção em massa de plásticos nos anos 1950, a humanidade testemunhou a geração de 8,3 bilhões de toneladas desse material. No entanto, menos de 9% são submetidas ao processo de reciclagem. O restante vai para aterros sanitários ou é disperso no meio ambiente.

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Um estudo recente publicado na revista Science Advances indica que se a humanidade continuar nesse ritmo, até 2050 serão geradas mais de 12 bilhões de toneladas de resíduos plásticos. 

A União Europeia se destaca pelos progressos alcançados no tema, especialmente o Circular Economy Package, aprovado em 2018 pelo Parlamento Europeu. A legislação é atualmente reconhecida como a mais avançada globalmente no campo da economia circular.

Uma das metas estabelecida é atingir a marca de 65% de reaproveitamento e reciclagem dos resíduos sólidos urbanos até 2030, entre eles, o plástico, cuja meta é ainda mais desafiadora: reusar e reciclar 100% das embalagens plásticas. Mas a abordagem inclui todo o ciclo do material, incluindo a concepção, produção, utilização e reciclagem.

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A estratégia visa transformar a reciclagem em uma atividade economicamente vantajosa. Projetos indicam que melhorias nas instalações de coleta e o aumento da reciclagem podem resultar em economias aproximadas de € 100 por tonelada de plástico recolhida. Esse montante se soma aos já € 250 milhões previamente investidos, os quais foram destinados ao desenvolvimento de materiais plásticos mais inteligentes. 

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O case da madeira plástica

A madeira plástica é um exemplo de como o plástico pode ser reaproveitado de maneira inovadora, contribuindo para soluções sustentáveis na indústria. Cada vez mais solicitada nos setores de construção, ela se destaca por sua capacidade de imitar de forma convincente a aparência e a textura da madeira convencional e, ao mesmo tempo, atender aos requisitos técnicos industriais.

Essa alternativa ecologicamente consciente é confeccionada a partir de resíduos recicláveis, utilizando um avançado processo industrial que incorpora diversos tipos de plásticos reciclados, aditivos e fibras naturais ou vegetais. 

O potencial ilimitado do vidro

O vidro é outro material que se destaca como totalmente reciclável, com um potencial de reciclagem praticamente ilimitado. Composto por elementos naturais, como areia e calcário, esse material apresenta uma vantagem: pode ser 100% reciclado sem perder a qualidade original. 

Contudo, a reintegração do vidro no ciclo produtivo representa um dos desafios mais complexos, devido a dificuldades logísticas e operacionais. As associações de catadores destacam a presença de riscos para os trabalhadores, uma vez que os resíduos são descarregados por caminhões nas centrais de coleta, frequentemente resultando em quebras. Além disso, há uma carência de equipamentos especializados para a trituração e transporte eficiente, dificultando ainda mais o processo de reciclagem.

De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), o Brasil registra uma produção anual de mais de 8,6 bilhões de unidades de vidro, dos quais apenas 300 mil toneladas (quase 25%) são direcionadas para processos de reciclagem.

Diante de todos esses obstáculos, a Eureciclo, um projeto que visa garantir a logística reversa e a reciclagem de materiais, por meio de um investimento de R$ 3 milhões, inovou ao desenvolver uma abordagem para a reciclagem de vidro na capital do Amazonas.

O plano contemplou a estruturação da cadeia, a exemplo do que contempla a PNRS, estabelecendo conexões entre operadores e catadores de materiais recicláveis a espaços de armazenamento. Além disso, foi implantado um sistema de certificados de crédito de reciclagem, proporcionando remuneração adicional. O documento atesta que uma determinada quantidade de material foi direcionada para uma destinação final apropriada.

Em seis meses, a reciclagem de vidro em Manaus foi de zero a 800 toneladas por mês. Atualmente, o processo envolve a colaboração de oito cooperativas e operadores privados, responsáveis pela triagem do material e pelo gerenciamento do espaço de armazenamento, conhecido como hub. Desde o início do projeto em 2021, a capacidade de reaproveitamento dos resíduos teve um aumento superior a 100%.

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