Produção agrícola em comunidade! Conheça os agrobairros

Com hortas dentro das cidades, conceito proporciona segurança alimentar, menores preços e sustentabilidade

Por Nathalia Ribeiro em 17 de setembro de 2025 5 minutos de leitura

Dois jovens estão cuidando de uma horta urbana ao lado do local onde residem, ao fundo é possível ver um prédio residencial, ilustrando o conceito de agrobairros.
Imagem gerada por Inteligência Artificial

Os agrobairros unem o melhor de dois mundos: a conveniência das cidades e a possibilidade do contato com a natureza e de acesso a alimentos frescos. Tratam-se de pequenas áreas dentro das cidades, mas que contam com hortas.

Essa proximidade física entre a produção de alimentos e os consumidores tem também a vantagem de reduzir o impacto adverso no meio ambiente, já que minimiza a necessidade de transporte dos produtos em caminhões, geralmente movidos a combustíveis fósseis. 

André Nery Figueiredo (Foto: Arquivo pessoal)

O arquiteto André Nery Figueiredo, pesquisador e diretor da Faculdade de Arquitetura e Design da Universidad Científica del Sur, em Lima, no Peru, aponta, ainda, que os agrobairros melhoram o microclima urbano ao reduzirem ilhas de calor, além de ajudarem a aumentar a permeabilidade do solo. 

Agrobairro, um aliado contra a insegurança alimentar

Mãos de um homem colhendo tomates orgânicos frescos na horta de uma comunidade como os agrobairros
Foto: Sian Stock/ Adobe Stock

Um dos pontos de destaque do impacto dos agrobairros na vida da população urbana é sua capacidade de mitigar os chamados desertos alimentares e a insegurança alimentar decorrente deles.

Estudos conduzidos pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos definem um “deserto alimentar” como uma região na qual, no mínimo, 500 pessoas ou 33% de um setor censitário específico residem a mais de 1,6 km de um supermercado. A restrição de acesso a alimentos frescos, naturais e nutritivos evidencia a desigualdade social como uma barreira que impede as classes economicamente menos privilegiadas de atingirem a meta de uma alimentação de qualidade.

Segundo o relatório O Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo (SOFI), feito pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), cerca de 70,3 milhões de brasileiros (32,8% da população) encontram-se em situação de insegurança alimentar, que é a redução na quantidade e qualidade dos alimentos, assim como a falta deles por um ou mais dias. 

“Às vezes produtos aumentam de preço por causa do transporte, desde onde é produzido até chegar na mesa. Ao se produzir de maneira local, os custos de transporte e de produção são reduzidos. E, quando você produz de maneira local, você gera uma comunidade. Isso aumenta a possibilidade de que as próprias pessoas tenham benefício econômico nisso, melhorando a segurança alimentar. E essas pessoas sabem realmente a qualidade do que eles estão comendo, o que forma essa vida comunitária que, às vezes, não se tem nos bairros”, acrescenta o arquiteto.  

É o que já está sendo percebido por moradores do bairro de North End, na cidade americana de Detroit, onde a organização Michigan Urban Farming Initiative (MUFI) mantém um agrobairro denominado pelo grupo de Primeira Agricultura Urbana Sustentável dos Estados Unidos. 

Com o projeto, a MUFI busca promover educação, sustentabilidade e senso de comunidade e, assim, empoderar os moradores locais, além de ajudar a resolver problemas sociais enfrentados pela cidade e revitalizar áreas urbanas, por meio da implementação de hortas em terrenos antes abandonados.  

Com cerca de 1.400 hortas e fazendas comunitárias, o agrobairro de Detroit foi fundado em 2012. Em entrevista ao portal One Earth, o cofundador Tyson Gersh disse que o projeto passou de uma horta urbana que fornece produtos frescos para os moradores para um campus agrícola diversificado que ajuda a sustentar o bairro, atraindo novos moradores e investimentos para a área. 

“Para nós, a insegurança alimentar é o maior problema”, afirmou, ao mesmo site, Quan Blunt, gerente de uma das hortas urbanas de Detroit. “A loja de produtos frescos mais próxima deste bairro é a Whole Foods (a seis quilômetros de distância, em Midtown), e você sabe como eles podem ser caros”. 

O agrobairro de Detroit cultiva vegetais variados, mas principalmente pimentas e couves, que são os mais apreciados pelos moradores locais, revela Blunt. A população tem acesso gratuito à produção de todas as hortas da MUFI, mas um dos objetivos da organização é desenvolver receitas de molhos picantes com as pimentas frescas para vender, uma oportunidade econômica para a comunidade local. 

Inspiração colombiana 

Mais perto do Brasil, Medellín, na Colômbia, quer virar uma cidade repleta de agrobairros, com o projeto Huertas con Vos, comenta Figueiredo. “Basicamente, as pessoas que têm um área verde mínima de 10 metros quadrados (no pátio, no jardim ou em outra parte da casa) recebem do governo local uma ajuda, com doação de sementes, materiais e orientação para fazerem suas hortas na própria casa. Assim, muitas casas têm sua horta e até produção excedente que eles acabam vendendo. Isso aumenta a qualidade de vida das pessoas e reduz a insegurança alimentar, que é um tema importante a se trabalhar no Brasil”, defende o arquiteto. 

Com o projeto de Medellín, que é assessorado pela FAO, famílias vendem, por mês, 14 toneladas de batatas produzidas nas hortas de suas casas para restaurantes de escolas da cidade.

Articular políticas

Mãos de um homem plantando mudas de tomate em uma horta orgânica .
Foto: Stock Rocket/ Adobe Stock

No Brasil ainda não existem agrobairros, mas hortas urbanas se destacam ao promoverem educação ambiental, segurança alimentar e geração de renda. Além de diminuir a distância entre campo e cidade, são espaços de aprendizagem e experimentação, que ajudam a reduzir a insegurança alimentar e nutricional e a promover inclusão social, regeneração ambiental, redução dos gastos com energia e alimentos, fortalecimento comunitário e valorização cultural.

Leia também: Delícias do campo – na cidade! Hortas urbanas para se inspirar

Para Figueiredo, “o País melhorou bastante nesse tema, com a Política Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana. Muitas cidades brasileiras têm espaços vazios ou espaços intersticiais, entre bairros, entre zonas que eram industriais e estão mudando, ou que estão mudando a área de zonificação. E esses espaços podem ser utilizados como processos e projetos para melhorar justamente a qualidade de vida das pessoas que vivem aí”, comenta. Para isso, no entanto, é necessária a articulação das políticas públicas, que vão desde o governo federal e até as administrações municipais. “Precisamos lembrar que o Brasil é um país continental e cada lugar tem climas e particularidades que devem ser considerados. E também culturais, porque não são todas as propostas que podem ser aplicadas de maneira igual. A coordenação com o Ministério da Cidade seria fundamental, e com outros ministérios, como o do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, o do Trabalho, o do Meio Ambiente… para que juntos construam uma política integral de futuros projetos de agrobairros”, avalia.

Pelo potencial de transformar a maneira como se vive no ambiente urbano, os agrobairros podem ser um aliado para moldar o futuro das cidades e das pessoas.

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