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Em 6 anos, microapartamentos saltam 3.427% em São Paulo
Demandas urbanísticas e fatores econômicos, sociais e culturais justificam esse boom. No Japão, conceito já chegou ao extremo.
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Ana Cecília Panizza em 10 de julho de 2024 5minutos de leitura
Imagem gerada por Inteligência Artificial
A conta não fecha: as grandes cidades do mundo têm cada vez menos espaço para abrigar cada vez mais gente. Segundo estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU), a população urbana deve passar de 56% do total global em 2021 para 68% em 2050. Um dos desafios? Déficit habitacional. Uma das estratégias para responder a essa demanda são os microapartamentos e estúdios. De acordo com o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP), o número de unidades habitacionais dessa modalidade passou de 461, em 2016, para 16.261, em 2022, um salto de 3.427%. Além de demandas urbanísticas, fatores econômicos, sociais e culturais justificam esse cenário.
Na maior cidade do Brasil, por exemplo, o Plano Diretor – que orienta a ocupação e o desenvolvimento do território – estimula a construção de prédios perto de eixos de transporte público (metrô, trem e corredores de ônibus), levando a um boom de lançamentos de edifícios com unidades cada vez menores (geralmente de até 30 metros quadrados), as antigas “quitinetes”, mas com algumas diferenças conceituais que visam agregar valor ao modelo contemporâneo.
Segundo o Secovi-SP, as zonas oeste e sul da capital paulista concentram os lançamentos de microapartamentos e estúdios e abrigam três de cada quatro unidades do tipo colocadas à venda (72,6%), entre os lançamentos em 2022. A região de Pinheiros (zona oeste) teve 2.991 lançamentos (18,4% do total da cidade) e inclui a Vila Madalena, bairro da moda e com infraestrutura de lazer para os jovens.
“São lançamentos muitas vezes em áreas valorizadas, que diminuem bastante as áreas úteis das unidades, e elevam as margens de lucro das incorporadoras. Muitas vezes, localizam-se no chamados Eixos de Estruturação e Transformação Urbana, e em tese, devem atender a populações de menor renda para adensar áreas da cidade próximas de estações multimodais de transporte público e eixos de transporte, mas acabam por beneficiar classes de renda média, não cumprindo seus desígnios”, destaca a professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Eunice Helena Sguizzardi Abascal.
A praticidade dos microapartamentos
Quem vive em São Paulo quer diminuir o tempo gasto com transporte e morar mais perto do trabalho e do lazer, ou seja, em áreas onde o metro quadrado é mais disputado e, portanto, mais caro. Os espaços pequenos são uma forma que as construtoras encontraram de atender a essa demanda de mercado, equalizando o valor total do imóvel.
Em contrapartida ao espaço interno compacto, as áreas comuns dos prédios que sediam os microapartamentos reúnem lavanderia, espaço gourmet, salão de festa, churrasqueira, academia e outros espaços compartilhados. Também é comum uma fachada ativa, que agrega comércio e serviços no térreo. “Tais edifícios têm equipamentos de uso coletivo, como cozinha, lavanderia e área social, mas, por vezes, o padrão de qualidade de construção e a localização, têm como consequências altos custos do valor do condomínio”, pondera Eunice Helena Sguizzardi Abascal, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
O modelo também atende a um perfil de público que preza pela praticidade, priorizando menos tempo de locomoção, preferencialmente, de transporte público, e um bairro com grande oferta de lazer e serviços, em vez de um lar maior (e mais longe), que demanda mais dedicação e tempo para manter organizado e limpo.
Família não tradicional
O formato também atende “a um público que busca espaço adequado para novas composições familiares, como pessoas que moram sozinhas, casais sem ou com um filho”, como destaca Eunice, assim como os chamados nômades digitais. Dados do último censo (2022) divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que uma parcela cada vez maior de brasileiros vive sozinha. Em 2022, do total de 74,1 milhões de domicílios, 15,9% (11,8 milhões) tinham apenas um morador. É a maior proporção desse tipo de núcleo familiar desde o início da série histórica, em 2012, quando os lares com apenas uma pessoa representavam 12,2%.
Microapartamentos atendem, ainda, a outro público: os idosos. De acordo com o Censo 2022, a população idosa brasileira chegou a 22.169.101, o que representa 10,9% de todos os habitantes do País.
Outro público atendido é o de pessoas que escolhem ter um pet e não um filho, levando a um crescente número de animais de estimação e a uma relação cada vez mais estreita entre os humanos e os bichanos, formando as chamadas famílias multiespécies nas áreas urbanas.
Levantamento da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp) aponta que o tamanho dos imóveis pequenos caiu 40% em uma década. Segundo o estudo, os apartamentos de um dormitório na cidade de São Paulo tinham metragem média de 46,1 m² em 2011. Em 2021, o tamanho caiu para 27,5 m².
No Japão, em uma área nobre da capital Tóquio, a mais populosa do mundo, com 37 milhões de pessoas, o menor apartamento tem apenas 5 m² a um aluguel mensal equivalente a R$ 3.500. Ao esticar os braços, é quase possível tocar ambas as paredes. A área é tão pequena que moradores fazem refeições em pé! São jovens profissionais japoneses, que preferem viver nesses locais, em regiões bem localizadas, para não precisar pegar transporte público lotado na volta para casa, já que isso leva a cansaços físico e mental. O aluguel e o custo de vida seria mais barato nos subúrbios, mas seria muito longe do trabalho.
Se no Brasil os microapartamentos acentuam o debate sobre as políticas de adensamento das áreas urbanas próximas de estações multimodais de transporte público e eixos de transporte, no Japão os apartamentos cada vez menores para dar conta de abrigar sua população gigantesca em um território montanhoso trazem à tona a preocupação com a qualidade de vida e até a saúde mental de seus moradores. Com dimensões tão reduzidas podem faltar no ambiente ventilação e iluminação externa, além de privacidade, no caso de duas pessoas que dividem a residência – um casal, por exemplo. Tudo isso pode prejudicar a saúde mental e o bem-estar do morador.
Os microapartamentos são, assim, uma resposta ao problema da falta de espaço em grandes cidades do Brasil e do mundo e atendem a novos perfis comportamentais que buscam um estilo de vida cada vez mais prático e independente. Ponderar o limite e os custos financeiros, sociais e psicológicos, no entanto, é fundamental.
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