Artigo da Universidade de Michigan afirma que fazendas urbanas emitem seis vezes mais CO2 do que agricultura convencional
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Redação em 16 de outubro de 2024 5minutos de leitura
Foto: Yang Zhen Siang/ Shutterstock
As fazendas urbanas têm se destacado como uma das soluções para abastecer a população mundial de alimentos. O modelo consiste no cultivo de frutas, legumes e hortaliças em cidades ou no entorno delas, seja ao ar livre ou em espaços fechados. Segundo Geraldo Maia, um dos proprietários da maior fazenda vertical urbana da América Latina, que fica em um galpão em São Paulo, a agricultura urbana é considerada mais sustentável do que a convencional e os alimentos produzidos por ela são mais saudáveis por serem orgânicos, sem agrotóxicos, pois para o mesmo quilo de alimentos produzidos, a fazenda urbana precisa de 400 vezes menos área, de 95% menos de água e de 60% menos fertilizantes. E lá não se usa agrotóxico.
Por outro lado, pesquisadores da Universidade de Michigan descobriram que, em média, frutas e legumes produzidos pela agricultura urbana têm uma pegada de carbono seis vezes maior do que os cultivados em fazendas convencionais. Ou seja, emitem mais Gases de Efeito Estufa (GEE), que se acumulam na atmosfera provocando o aquecimento global e as mudanças climáticas.
Porção de fruta com carbono
As descobertas dos pesquisadores de Michigan estão reunidas no artigo “Comparing the carbon footprints of urban and conventional agriculture” (Comparando as pegadas de carbono da agricultura urbana e convencional, em tradução livre), publicado na plataforma Nature Cities em janeiro de 2024. O estudo revela que cada porção de frutas e legumes cultivada em fazendas urbanas gera cerca de 500 gramas de dióxido de carbono contra 70 gramas a 80 gramas em locais de agricultura convencional. O artigo foi feito com 73 fazendas urbanas na Europa e nos Estados Unidos. A principal razão para a maior pegada de carbono das fazendas urbanas reside nos materiais usados para construí-las, ou seja, pela infraestrutura (canteiros e galpões elevados). Isso porque, os equipamentos funcionam por pouco tempo: anos ou uma década. E, para construí-los, é necessário o uso intensivo de materiais, energia e processos que emitem GEE.
Como, então, reduzir a pegada de carbono de alimentos cultivados nas fazendas urbanas? Para os pesquisadores de Michigan, uma alternativa é prolongar a vida útil dos canteiros e galpões elevados, além de reutilizar resíduos (entulhos de construção, por exemplo) e reutilizar água da chuva.
A escolha dos produtos cultivados nas fazendas urbanas também contribui. Segundo o estudo, entre as culturas com menos pegada de carbono estão tomate, aspargos, pepino, alface, pimentão, espinafre e morangos.
Bem-estar
A agricultura urbana é praticada por cerca de 800 milhões de pessoas no mundo, segundo a Food and Agriculture Organization (FAO), Organização para a Alimentação e a Agricultura da Organização das Nações Unidas (ONU). E está nas pessoas sua principal força, como mostra o artigo. A partir das percepções mapeadas em uma pesquisa feita com agricultores e jardineiros que trabalham com agricultura urbana, eles apontam como benefícios sociais a melhora na saúde mental e na alimentação. As interações sociais também foram apontadas como benefício do ponto de vista social. A análise de um jardim coletivo com agricultura urbana no Reino Unido identificou, por exemplo, que, além de melhoras no bem-estar, houve redução de internações hospitalares dos agricultores. Assim, diz o artigo, esses espaços de cultivo urbano maximizam os benefícios sociais e podem superar a agricultura convencional nesse sentido.
Com cultivos no nível do solo ou em terraços e telhados, as fazendas urbanas ainda beneficiam as cidades porque ajudam a aumentar a biodiversidade, criar sistemas alimentares mais resilientes, melhorar a qualidade do ar, refrescar o ambiente e controlar o escoamento de água de chuvas.
Especificamente no Brasil, como as descobertas do estudo americano impactam as fazendas verticais? Para o engenheiro ambiental José Antônio Silveira Ferreira, especialista em sustentabilidade, é preciso olhar primeiramente para a origem dos dados do estudo: ele foi realizado na Europa (França, Alemanha, Polônia e Reino Unido) e nos Estados, locais com matriz energética totalmente diferente da brasileira, frisa ele. “Então não podemos correlacioná-lo diretamente com as fazendas urbanas do Brasil. O estudo traz um norte, porém se faz necessário um estudo no Brasil para podermos fazer uma correlação com os dados apresentados”.
Ferreira trabalha há 10 anos como especialista em sustentabilidade na multinacional brasileira de carne bovina Marfrig, onde lidera e coordena a elaboração de relatórios de sustentabilidade com base no GRI (Global Reporting Initiative) e no Inventário de GEE. Segundo o engenheiro, o artigo dos pesquisadores de Michigan descreve que o maior volume de emissões nas fazendas urbanas vem do uso de energia elétrica, o que é menor em países com climas tropicais como o Brasil, porque o tempo de luz solar é maior no verão e no inverno não há dias com menos de oito horas de iluminação natural, ao contrário dos países de clima temperado. “Cabe lembrar também que o estudo avaliou as fazendas urbanas de baixa tecnologia, não as fazendas urbanas indoor, climatizadas, que usam luzes específicas para aumentar a produtividade no menor espaço possível”, explica.
Ele lembra que a maior parte das fazendas urbanas usa compostos orgânicos ao invés de fertilizantes industriais, o que é um ganho relevante porque leva a uma menor emissão, durante o processo, de óxido nitroso, que é um gás de efeito estufa com grande potencial de aquecimento. “Pode-se destacar também que a compostagem, quando realizada de maneira equivocada, emite metano, que também é um gás com poder de aquecimento alto quando comparado ao gás carbônico. Uma solução é melhorar esse processo de compostagem utilizando tecnologias que não permitem a geração de metano, reduzindo assim as emissões provenientes do uso do composto orgânico”.
Sobre a vida útil das estruturas das fazendas urbanas, o ideal, segundo Ferreira, é que sejam décadas, “pois quanto maior o tempo de utilização maior é a diluição das emissões de construção dos canteiros, pois não há novas emissões ligadas a novos canteiros”. Assim, a utilização de materiais mais resistentes ao tempo com melhor manejo do substrato (terra) utilizado traz redução nas emissões finais dos alimentos produzidos.
O especialista chama a atenção para a produção de frutas, que podem ser mais viáveis em fazendas urbanas do que no modo de agricultura convencional. “Na forma de agricultura convencional temos as emissões do transporte, que, na sua grande maioria, ainda está vinculado a uma matriz fóssil, que é o diesel. E isso faz com que, no final do processo de produção, as emissões totais das frutas sejam superiores quando produzidas de forma convencional em comparação com as produzidas nas fazendas urbanas, pois essas já estão próximas dos consumidores finais. Tem menor emissão proveniente do transporte”. Ferreira pontua que o artigo não contabilizou as perdas de alimentos pelo transporte realizado de forma inadequada ou pela distância que os alimentos percorrem para serem oferecidos à população.
Para o engenheiro ambiental, as fazendas urbanas são de extrema importância também em função dos benefícios sociais. “A área das fazendas urbanas comunitárias vira um local de confraternização, com aproximação entre as pessoas. Os ganhos da socialização são maiores e mais benéficos do que os impactos negativos das emissões de gases de efeito estufa.” Para ele, os benefícios sociais e o bem-estar da população envolvida nesse tipo de atividade são os maiores ganhos de todos quando se trata de fazendas urbanas. “Vale a pena seguir com a atividade agrícola nas cidades”, conclui Ferreira.
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