Smart Cities são o futuro das cidades?

As smart cities se popularizaram pelo uso da tecnologia em prol do desenvolvimento urbano e da qualidade de vida. Mas até que ponto elas são o caminho para o futuro?

Por Redação em 8 de agosto de 2022 7 minutos de leitura

smart cities

As smart cities, também chamadas de cidades inteligentes, costumam ser caracterizadas pelo uso estratégico da tecnologia com foco no aprimoramento da infraestrutura urbana, tendo em vista o desenvolvimento sustentável diante de uma realidade global que traz diversos desafios.

Um estudo realizado pela ONU prevê que a população mundial chegará a 8,6 bilhões de pessoas até 2030. Já no final do século, serão 11 bilhões de humanos no mundo, muito acima dos atuais 7 bilhões. E com um agravante: até a metade do século XXI, dois terços das pessoas morarão nas cidades, sendo que pelo menos 3 bilhões delas estarão vivendo em comunidades precárias, segundo a pesquisadora norte-americana Janice Perlman.

A eficiência que a tecnologia pode agregar aos serviços públicos e à vida das pessoas, de forma geral, é o que faz do conceito um caminho possível para superação dos desafios urbanos que esse crescimento exponencial implica. Mas integrar tudo isso aos aspectos sociais, com resiliência às mudanças climáticas, equalizando todos os temas que envolvem a questão, como emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) e biodiversidade, por exemplo, também desafia o próprio conceito. 

Há também os desafios dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, em especial o ODS 11, que visa tornar as cidades e comunidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis. Seria o conceito de smart city suficiente para dar conta de todas essas demandas? Entender o que é uma cidade inteligente e o que, de fato, a torna digna desse adjetivo, bem como conhecer os modelos já existentes e seus impactos podem apontar a resposta a essa questão. Confira a seguir!

O que são as smart cities

O termo “smart city” surgiu na década de 1990 e vem ganhando mais importância nos últimos anos em razão da elevada concentração de pessoas nos centros urbanos.

De acordo com a definição da União Europeia, as cidades inteligentes são sistemas de moradores interagindo e utilizando energia, serviços e materiais rumo ao desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida. O modelo é denominado inteligente devido a esse fluxo de ações coletivas serem realizadas por meio do uso estratégico de infraestrutura, serviços, informação e comunicação, integrados à gestão urbana para contemplar as necessidades sociais e financeiras da sociedade. 

Segundo o relatório Cities in Motion, publicado pelo IESE Business School, Universidade de Navarra, na Espanha, existem 9 indicadores de inteligência urbana. São eles: 

  • Capital humano;
  • Coesão social;
  • Governança;
  • Economia;
  • Meio ambiente;
  • Mobilidade e transporte;
  • Reconhecimento internacional;
  • Planejamento urbano;
  • Tecnologia. 

Em resumo, as cidades inteligentes seriam aquelas que otimizam a utilização dos recursos para servir seus cidadãos de forma eficaz e facilitadora. 

Qual o objetivo das smart cities?

As smart cities têm como principal objetivo transformar o desenvolvimento urbano em todos os aspectos sustentáveis para alinhar os avanços tecnológicos com o progresso socioambiental, atuando no letramento digital, na gestão colaborativa e solução de problemas reais, visando reduzir desigualdades e promover bem-estar. 

  A ideia é que seus cidadãos tenham acesso a melhores serviços públicos, desde mobilidade e transporte, até educação, segurança, saúde, cultura, gestão de iluminação pública, controle da poluição do ar, acesso e qualidade de habitação e o uso racional de recursos naturais, como água, carvão mineral, petróleo, entre outros, primando pela conservação do Planeta e, na medida do possível, reversão dos impactos negativos já gerados, como aponta nesta entrevista Cristiane Anselmo, estrategista de marketing e inovação social, cofundadora da Devir Social – consultoria especializada na implementação de soluções de impacto.

O que torna as smart cities inteligentes?

Além de todas as características citadas anteriormente, as smart cities colocam as pessoas no centro de todo o desenvolvimento. As tecnologias de informação, comunicação e melhoramento da gestão urbana são utilizadas como ferramentas para estimular a criação de uma sociedade que incorpora o planejamento colaborativo e participativo.

O conceito de cidade inteligente anda lado a lado com o de sociedade 5.0, criado no Japão em 2016, que se refere a uma nova sociedade, em que a tecnologia está centrada na busca por soluções realmente valiosas para o ser humano. Sendo assim, uma smart city torna-se inovadora e resiliente através do uso de Inteligência Artificial (IA), Internet das Coisas (IoT), Computação em Nuvem e Energias Renováveis, entre outros recursos tecnológicos, unindo os resultados desses fatores para a integração entre a cidade e empresas, pessoas, universidades, ONGs, entre outras partes interessadas. Portanto, uma cidade inteligente demanda investimento em planejamento urbano que inclua tecnologias e ações sustentáveis.

Como funciona uma smart city?

Seguindo o objetivo de fazer com que a tecnologia traga benefícios para os moradores da cidade, as smart cities possuem inúmeras camadas de funcionamento. Diversas soluções são integradas à Internet das Coisas, ou seja, existem dispositivos físicos espalhados pela cidade que se conectam a softwares e sistemas elétricos autônomos a fim de embasar a tomada de decisões do poder público. 

Uma cidade inteligente, por exemplo, pode ter transporte público integrado, além de opções dinâmicas de mobilidade que gerenciam o tráfego de forma eficaz, trazendo alternativas de horários menos movimentados e rotas diferentes, tudo através de aplicativos públicos de trânsito. Além disso, câmeras de alta tecnologia monitoram as ruas da cidade, aumentando a segurança dos cidadãos e ajudando em investigações criminais. 

A saúde, por sua vez, pode fazer uso de ferramentas digitais para aprimorar a experiência dos pacientes e oferecer tratamentos otimizados para doenças. Já na questão do meio ambiente é possível fazer o monitoramento da qualidade do ar, otimização de energia e identificar desperdício de água, criando redes hidráulicas controladas por centrais remotas.

Em resumo, seus mecanismos tecnológicos são capazes de gerar uma enorme quantidade de dados e atuar em processos automatizados que possibilitam melhorias em vários aspectos da vida das pessoas e da infraestrutura urbana. 

Smart cities no mundo

A União Europeia considera em seu site cerca de 345 cidades da região que se enquadram no conceito de cidades inteligentes ou que possuem projetos em andamento, entre elas está Barcelona, na Espanha. A gestão de resíduos contribuiu para esse desempenho: escotilhas foram distribuídas pela cidade e recolhem o lixo de hora em hora, durante os 7 dias da semana. Ao chegar no centro de coleta, o lixo é separado entre material reciclável e orgânico. Este, inclusive, serve como matéria-prima para geração de energia elétrica. A cidade espanhola também se destaca pela evolução alcançada nos últimos dois anos, de acordo com o ranking do IESE Cities in Motion (ICIM), elaborado pelo Centro de Globalización y Estrategia del IESE, da Espanha.

Já de acordo com o estudo Cities in Motion, o top 5 das smart cities mundiais é composto por Londres, (Inglaterra), Nova Iorque (Estados Unidos), Paris (França), Tóquio (Japão) e Reykjavik (Islândia). Na capital inglesa, por exemplo, há um alto investimento em escolas de negócios e universidades de qualidade. Além disso, Londres desenvolveu ruas com infraestrutura inteligente que oferecem wi-fi gratuito, iluminação, áreas para recarregar veículos elétricos e sensores de qualidade do ar. Já Nova Iorque possui gestão de trânsito que utiliza sensores e câmeras com a finalidade de fornecer estatísticas e modificar os padrões dos semáforos nas regiões mais movimentadas, otimizando o tempo de viagem dos passageiros em até 10%. O paradigma fica com cidades como Tóquio que, embora figure em posição de destaque nas listas, está na 125ª posição em relação à coesão social. Aliás, como mostramos nesta matéria, este parece ser um padrão: metade do pelotão das dez mais inteligentes ocupam as últimas posições no critério de coesão social, o que coloca em cheque uma das premissas do conceito: a tecnologia em prol das pessoas e evidencia a urgência do olhar estratégico e direcionado ao ODS 11.

Smart cities brasileiras

Ainda no ranking da IESE, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba e Belo Horizonte aparecem na lista de 174 principais smart cities do mundo. 

Na seleção da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), baseada em três normas internacionais regulamentadas pelo World Council on City Data, ligado à Organização das Nações Unidas (ONU), São José dos Campos, no interior de São Paulo, se destaca como a primeira cidade inteligente do País. Os investimentos tecnológicos nas áreas da saúde, educação, mobilidade e segurança pública fizeram a diferença para a conquista desse reconhecimento. 

No quesito transporte, criou-se um corredor de transporte público que contempla veículos elétricos, além de ciclovias e áreas verdes para impulsionar a mobilidade sem automóveis. A Internet das Coisas também está inclusa no projeto da cidade, integrando as vagas disponibilizadas nas vias públicas para informar motoristas onde existe espaço para estacionar nas ruas. 

Partindo do conceito de conectividade, o ranking Connected Smart Cities mapeou, em 2021, 677 municípios com mais de 50 mil habitantes no País, avaliando 75 indicadores em 11 eixos temáticos. No top três, em ordem decrescente, estão São Paulo/SP, Florianópolis/SC e Curitiba/PR.

Quais os benefícios das cidades inteligentes?

As vantagens são diversas. Entre elas, wi-fi público de alta velocidade para a integração total dos sistemas, mas os benefícios vão além da internet, por exemplo: 

  • Modernização do transporte público, incluindo a preocupação com modelos de veículos menos poluentes;
  • Agilidade para a realização de serviços de emergência, gerando um tempo mais curto de resposta;
  • Eficiência energética, visando o menor consumo de energia elétrica;
  • Medição e controle de temperatura, umidade, qualidade do ar, entre outros; 
  • Economia de tempo das pessoas;
  • Segurança;
  • Custo de vida;
  • Acesso a dados atualizados que facilitam a vivência na cidade.

Os desafios das smart cities

De acordo com o Distrito Smart Cities Report 2020, o Brasil conta com 166 startups dedicadas à causa das cidades inteligentes, que receberam US$ 49,4 milhões em aportes no ano de 2019. O estudo indica que, globalmente, essas companhias irão movimentar US$ 110,7 bilhões em receitas até 2025. 

Porém, as soluções inovadoras enfrentam os desafios urbanos, como trânsito, gerenciamento de energia, governança eletrônica, situação climática global, excesso de resíduos sólidos e ameaças à segurança pública e cibernética. Este último, reforçado pela desconfiança da população em relação a como os seus dados serão manejados em um sistema tecnológico e totalmente integrado. Segundo um estudo realizado pela multinacional IBM, 96% dos brasileiros não confiam que seus dados estejam protegidos. Vale lembrar que colocar os interesses das pessoas em perspectiva também faz parte do conceito de smart city. 

Portanto, a articulação de uma cidade inteligente passa pela busca de sinergias e integração entre os setores público, privado e a sociedade civil como um todo, em um debate transversal. Embora complexo, até em função da magnitude dos desafios, o processo não é rápido. Mas a grandeza e duração dos impactos, bem como seu poder de gerar um ciclo virtuoso para o desenvolvimento sustentável, faz o esforço valer a pena.