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Plantações de arroz inspiram soluções urbanas em países da Ásia
Em cidades asiáticas, práticas agrícolas milenares se transformam em soluções sustentáveis de resiliência climática.
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Nathalia Ribeiro em 10 de março de 2025 5minutos de leitura
Foto: Thirawatana/ Adobe Stock
Nas últimas décadas, as cidades asiáticas enfrentaram um aumento significativo no número de enchentes, intensificado pelas mudanças climáticas e pelo crescimento urbano desordenado. Em vez de buscar soluções disruptivas, algumas dessas cidades estão olhando para suas próprias tradições agrícolas em busca de inovação. Uma delas é a técnica de manejo de água inspirada nas plantações de arroz, que tem mostrado resultados promissores na prevenção de enchentes e na melhoria da infraestrutura urbana.
A ideia de utilizar plantações de arroz para mitigar alagamentos vem de um conceito simples, mas eficaz: as plantações de arroz sempre foram gerenciadas em campos alagados, ou arrozais, que ajudam a controlar a água das chuvas, absorvendo grandes volumes de água e permitindo que ela seja liberada de maneira gradual. Essa prática tem sido uma constante na cultura agrícola asiática, especialmente em países como Japão, China, Tailândia e Vietnã.
Então, em vez de depender exclusivamente de infraestruturas de drenagem convencionais, como bueiros e túneis subterrâneos, por que não usar esse modelo para reimaginar os sistemas de drenagem urbana? Imitar os campos de arroz, com áreas alagadas estrategicamente localizadas, reservatórios e zonas de absorção de água tem sido a aposta.
Plantações de arroz como inspiração para a arquitetura
Nos anos 1980, as enchentes em Bangkok eram motivo de diversão para Kotchakorn Voraakhom. Em uma reportagem da BBC, a arquiteta paisagista relembra com carinho os dias em que navegava pelas águas da inundação em um pequeno barco feito pelo pai. “Eu fiquei tão feliz por não precisar ir à escola porque não sabíamos como chegar lá”, recorda.
Três décadas depois, porém, as enchentes deixaram de ser uma lembrança nostálgica e se tornaram uma ameaça real. Em 2011, Bangkok foi atingida por uma das piores inundações de sua história. As chuvas torrenciais duraram mais de três meses, desalojaram milhões de pessoas e mataram mais de 800. Cientistas atribuíram o desastre ao aumento das emissões de gases do efeito estufa, que intensificaram as chuvas.
Determinada a agir, Voraakhom fundou o escritório Landprocess e começou a projetar soluções urbanas inspiradas na natureza para tornar sua cidade mais resiliente. Seu projeto mais emblemático é o telhado verde da Universidade Thammasat, uma estrutura baseada nas práticas agrícolas de plantação de arroz, que permite o cultivo de alimentos e a gestão eficiente da água da chuva.
Inaugurada em 2019, a instalação na Universidade se tornou, na época, a maior fazenda urbana em telhado da Ásia. Dos 22 mil m² da estrutura, 7 mil foram destinados à agricultura orgânica, consolidando o campus como um exemplo de inovação sustentável que integra urbanismo, meio ambiente e segurança alimentar.
A estrutura conta com quatro tanques de retenção, estrategicamente posicionados ao redor do prédio para capturar e armazenar o excesso de água. Em períodos de estiagem, esse recurso é reaproveitado: a água acumulada é bombeada de volta para os campos de arroz utilizando energia limpa gerada por painéis solares instalados no próprio telhado.
O conceito da plantação de arroz na prática arquitetônica
Originários da bacia do rio Yangtze, na China, há mais de 5 mil anos, os terraços de arroz são construídos seguindo as curvas naturais do terreno, com cada nível mantendo a mesma elevação. Essa estrutura permite a captação e retenção da água da chuva, que é usada para irrigar os campos. Em regiões como o sul da China, os terraços também ajudam a reduzir e a purificar o fluxo de água que desce das montanhas, prevenindo enchentes e erosão.
Rio Yangtze (Foto: Jakrit Jiraratwaro/ Shutterstock)
Em entrevista à BBC, Voraakhom destaca que telhados verdes podem reduzir em até 20 vezes a velocidade do escoamento da água da chuva em comparação com superfícies de concreto. Esse controle é essencial em uma cidade como Bangkok, onde o escoamento rápido sobre áreas impermeáveis agrava as enchentes.
Além da gestão hídrica, essas estruturas também oferecem conforto térmico. Durante os verões intensos da Tailândia, os telhados verdes ajudam a reduzir a temperatura interna dos edifícios em até 4 °C, proporcionando um alívio natural ao calor e diminuindo a dependência de ar-condicionado.
Essa tecnologia ancestral, transmitida por gerações de agricultores, agora está sendo adaptada para o contexto urbano. O professor Yu Kongjian, da Universidade de Pequim e criador do conceito de “cidade-esponja“, defende que as cidades asiáticas, muitas delas afetadas por climas de monção, devem adotar soluções baseadas na natureza.
Em algumas cidades chinesas, até um terço da chuva anual pode cair em um único dia, exigindo medidas eficazes de controle. Yu argumenta que os métodos tradicionais, como os terraços de arroz, já foram testados e comprovados ao longo de milênios e podem ser a chave para enfrentar os desafios climáticos atuais.
Telhados verdes no Brasil
A adoção de telhados verdes tem ganhado força no Brasil como uma solução eficaz para melhorar a sustentabilidade dos edifícios, reduzindo impactos ambientais e promovendo o reaproveitamento de recursos. Embora os projetos nacionais não sejam diretamente inspirados em plantações de arroz, o conceito e os objetivos são semelhantes: integrar a natureza ao ambiente urbano, trazendo benefícios práticos e ecológicos. Hospitais, shoppings e escolas estão entre os espaços que vêm investindo em coberturas vegetais, que contribuem para a captação de água da chuva, o isolamento térmico e até mesmo a produção de alimentos.
Em Belo Horizonte/MG, o Hospital Orizonti – Instituto Oncomed de Saúde e Longevidade incorporou um dos maiores telhados verdes da cidade. Com 6.942 m² de cobertura vegetal, o hospital consegue captar e armazenar até 370 mil litros de água da chuva, utilizada para irrigação e limpeza de algumas áreas. Além da eficiência hídrica, a vegetação na cobertura contribui para a regulação térmica do prédio, reduzindo o consumo de energia com climatização.
Foto: Divulgação/ Hospital Orizonti
Já em São Paulo, desde 2012 o Shopping Eldorado investe em um projeto de reciclagem e compostagem para reduzir o desperdício gerado em suas praças de alimentação. Cerca de 2 toneladas de lixo orgânico por dia são transformadas em adubo por meio da aplicação de enzimas que aceleram a decomposição e eliminam odores. Esse adubo é utilizado justamente em uma horta instalada no telhado verde do shopping, onde são cultivados legumes e verduras livres de agrotóxicos. A produção é destinada aos próprios colaboradores do estabelecimento, promovendo um ciclo sustentável e incentivando o consumo consciente.
Enquanto no Rio de Janeiro, o Colégio Estadual Erich Walter Heine se destaca como a primeira escola verde do Brasil. Além de contar com energia solar, reaproveitamento de água da chuva, iluminação natural e uma área dedicada à reciclagem, a instituição possui um “ecotelhado”, onde plantas foram integradas à estrutura do prédio. Essa cobertura vegetal ajuda a reter água para reuso, melhora o conforto térmico dos ambientes e ainda contribui para a neutralização das emissões de carbono.
Enquanto na Ásia os terraços de arroz servem de modelo para mitigar enchentes, no Brasil as coberturas vegetais estão sendo implementadas para melhorar a gestão hídrica, reduzir ilhas de calor e aumentar a eficiência energética. Esses projetos ressaltam que soluções baseadas na natureza não apenas trazem benefícios ambientais, mas também promovem cidades mais resilientes, saudáveis e sustentáveis.
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